segunda-feira, 27 de abril de 2009

Entidades querem amplo debate sobre a nova proposta de vestibular


Entidades representativas de instituições federais de ensino superior, dos professores e estudantes querem um amplo debate sobre o novo modelo de vestibular proposto pelo governo.
A nova proposta foi recebida com entusiasmo, mas despertou incertezas e dúvidas acerca da segurança do novo modelo, à manutenção da autonomia das universidades e à garantia na qualidade dos alunos que serão selecionados pelo novo vestibular proposto, que prevê uma prova única em todo o País. A proposta do Ministério da Educação é de que o atual Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) seja aprimorado e usado como porta de entrada para as universidades federais.

“É uma iniciativa muito positiva, porém temos que conservar sobre três importantes aspectos: autonomia das universidades, garantia de ingresso dos candidatos mais preparados e segurança no processo seletivo. A segurança deste novo processo precisa ser plena”, afirmou o Secretário Executivo da Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduino. Segundo ele, o vestibular é um dos processos seletivos mais respeitados pela sociedade atualmente.
O secretário anunciou a realização de um seminário para tratar das mudanças nos próximos dias 27 e 28. O evento será em Brasília e deverá contar com a participação de todas as entidades envolvidas no processo. “Ainda não temos uma opinião formada sobre a proposta. Vamos intensificar o debate para assegurar que estas questões sejam asseguradas”, afirmou.

Exaustão

O presidente do Fórum de Professores das Instituições Federais de Ensino Superior (Proifes), Gil Vicente Figueiredo, disse que para a instituição, o atual modelo de vestibular está ultrapassado. “O vestibular aplicado hoje deixa muito a desejar. Esta é uma proposta importantíssima e inovadora que merece um amplo debate com a sociedade e as entidades de ensino superior e estudantes. Como toda proposta nova, ela requer uma profunda avaliação”, afirmou.
Uma das preocupações da instituição, segundo o dirigente, é com as disparidades regionais na qualidade do ensino praticado no País. “A unificação das provas traz benefícios e malefícios. Existem diferenças regionais no ensino brasileiro que precisam ser consideradas neste novo processo. Temos que assegurar que alunos de qualquer região do País tenham condições de acesso às vagas, independentemente de onde tenham cursado o ensino médio”, disse.

Descontentamento

Para a União Nacional dos Estudantes (UNE) a simples substituição do vestibular pelo Enem não será suficiente para aprimorar o processo seletivo do País. “A proposta apresentada pelo MEC é resultado de pressões históricas dos movimentos estudantis por mudanças no processo seletivo. No entanto, esperavamos ser ouvidos quando da elaboração desta proposta. Acreditamos que é preciso fazer mais do que substituir o vestibular pelo Enem”, afirmou Lúcia Stumpf, presidente da UNE.
Uma das propostas da UNE é a de que a seleção seja feita em avaliações seriadas, semelhante ao Programa de Avaliação Seriada (PAS), implantado pela Universidade Federal de Brasília, onde o aluno faz três provas no primeiro, segundo e terceiro ano do ensino médio, respectivamente. “Desta maneira, o aluno faria o teste de aprendizado assim que concluir cada fase. Isso nos daria uma leitura mais pontual do grau de assimilação do aluno e evitaria as práticas do decoreba. Ao final dos três anos, a média das provas seria a nota do aluno para disputar o processo seletivo das federais”, propôs Lúcia Stumpf.

Assistência estudantil

A UNE também defende que a proposta venha associada a recursos para assistência estudantil e indicação de cotas para alunos de baixo poder aquisitivo e negros. “Para assegurar mobilidade o governo precisa indicar recursos para o custeio dos alunos que eventualmente venham de outros estados. Recursos para transporte, alimentação e moradia são indispensáveis para o novo modelo. Além disso, há ainda a necessidade de implementação de cotas para assegurar o acesso de todas as classes sociais”, afirmou Lúcia Stumpf.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

37° CONGRESSO DA UEP: HORA DE APROFUNDAR O DEBATE POLÍTICO


Por Eduardo Nunes*

Aproxima-se o 37° Congresso da União dos Estudantes de Pernambuco e com ele as mais variadas discussões a cerca da educação superior brasileira e questões históricas referentes ao movimento estudantil; bem neste caso pensamos estar diante de um momento novo, um momento onde não só estaremos pautando as posições políticas do movimento mais estaremos diante de um embate muito maior e que exige uma visão ampla do atual quadro político brasileiro, as mudanças que vem sendo implementadas na educação brasileira, as condições que a vitória eleitoral de Lula trouxe de efetivar uma agenda pós-neoliberal no Brasil depois do desastre educacional causado na era FHC e, sobretudo, a necessidade do movimento estudantil no atual período de criar as condições para formulação e mobilização para avançar na superação do projeto neoliberal são apenas algumas questões que devem estar na ordem do dia das forças democráticas e populares que estarão presentes não só 37° congresso da UEP como 51° congresso da UNE.
O Partido dos Trabalhadores em Pernambuco através de sua juventude deve tomar decisões políticas acertadas para estar em condições para os embates que virão não apenas no âmbito do congresso, mas, sobretudo no momento político que se avizinha, precisamos criar as condições para debater de forma ampla com conjunto das forças a necessidade de participar de forma conseqüente do 37° congresso da UEP os debates e ações promovidos pela entidade ao longo do último período de gestão nos dão a dimensão exata dos desafios que teremos para o próximo período, as ações políticas conjuntas apresentam uma unidade política clara do ponto de vista estratégico colocando em evidência as juventudes do (PT, PC do B e PSB), pois as diversas resoluções políticas conjuntas nos dão um grau consistente de unidade para colocar como pauta comum as questões referentes não só as ações da nossa combativa entidade como questões políticas colocadas na ordem do dia como à defesa do projeto de reforma universitária da UNE, a crítica a política econômica do BC colocando a necessidade de outra política de enfrentamento a atual crise econômica garantindo o direito da classe trabalhadora, o longo ciclo de debates e mobilização para o processo da conferência nacional de educação espaço fundamental para colocarmos nossas bandeiras históricas e nossa visão de modelo de educação e mais do que isso, a disputa de projetos nacionais que iremos travar nas eleições de 2010.
A JPT deve ser protagonista na construção do campo político das forças democráticas e populares na UEP, deve estar mais presente nas ações e no grande ciclo de debates e mobilizações que está colocado para o próximo período, uma visão ampla da nossa aliança estratégica é fundamental para o entendimento e enfrentamento dos novos embates políticos. A direita reacionária jogará o tempo todo para nos dividir neste momento histórico e se nós chegarmos ao ambiente do congresso contaminados com a exagerada visão de autoconstrução estaremos cometendo erros políticos estratégicos.
Por isso pretendendo estar à altura dos desafios que estão colocados o MOVIMENTO VIA ALTERNATIVA SOCIALISTA-PT se coloca na construção política da UNIÃO DOS ESTUDANTES DE PERNAMBUCO e na defesa do bloco democrático popular (PT, PC do B e PSB) constituído no âmbito das discussões do congresso e na manutenção da gestão ao longo deste importante período e defendemos:
I. Democratizar ainda mais a UEP para que ela possa acumular mais forças para estar à altura dos desafios apresentados;
II. Formular conjuntamente nossa proposta para conferencia nacional de educação a UEP deve estar com capacidade de debate e mobilização necessária;
III. Manutenção do bloco político para acúmulo de forças para defesa do projeto democrático popular no ambiente das eleições 2010 em Pernambuco e no Brasil.

*Eduardo Nunes é da Coordenação Geral do Movimento Via Alternativa Socialista-PT

terça-feira, 21 de abril de 2009

ESCLARECIMENTOS SOBRE ACONTECIMENTOS NO PARÁ


20/04/2009

Em relação ao episódio na região de Xinguara e Eldorado de Carajás, no sul do Pará, o MST esclarece que os trabalhadores rurais acampados foram vítimas da violência da segurança da Agropecuária Santa Bárbara. Os sem-terra não pretendiam fazer a ocupação da sede da fazenda nem fizeram reféns. Nenhum jornalista nem a advogada do grupo foram feitos reféns pelos acampados, que apenas fecharam a PA-150 em protestos pela liberação de três trabalhadores rurais detidos pelos seguranças. Os jornalistas permaneceram dentro da sede fazenda por vontade própria, como sustenta a Polícia Militar. Esclarecemos também que:

1- No sábado (18/4) pela manhã, 20 trabalhadores sem-terra entraram na mata para pegar lenha e palha para reforçar os barracos do acampamento em parte da Fazenda Espírito Santo, que estão danificados por conta das chuvas que assolam a região. A fazenda, que pertence à Agropecuária Santa Bárbara, do Banco Opportunity, está ocupada desde fevereiro, em protesto que denuncia que a área é devoluta. Depois de recolherem os materiais, passou um funcionário da fazenda com um caminhão. Os sem-terra o pararam na entrada da fazenda e falaram que precisavam buscar as palhas. O motorista disse que poderia dar uma carona e mandou a turma subir, se disponibilizando a levar a palha e a lenha até o acampamento.

2- O motorista avisou os seguranças da fazenda, que chegaram quando os trabalhadores rurais estavam carregando o caminhão. Os seguranças chegaram armados e passaram a ameaçar os sem-terra. O trabalhador rural Djalme Ferreira Silva foi obrigado a deitar no chão, enquanto os outros conseguiram fugir. O sem-terra foi preso, humilhado e espancado pelos seguranças da fazenda de Daniel Dantas.

3- Os trabalhadores sem-terra que conseguiram fugir voltaram para o acampamento, que tem 120 famílias, sem o companheiro Djalme. Avisaram os companheiros do acampamento, que resolveram ir até o local da guarita dos seguranças para resgatar o trabalhador rural detido. Logo depois, receberam a informação de que o companheiro tinha sido liberado. No período em que ficou detido, os seguranças mostraram uma lista de militantes do MST e mandaram-no indicar onde estavam. Depois, os seguranças mandaram uma ameaça por Djalme: vão matar todas as lideranças do acampamento.

4- Sem a palha e a lenha, os trabalhadores sem-terra precisavam voltar à outra parte da fazenda para pegar os materiais que já estavam separados. Por isso, organizaram uma marcha e voltaram para retirar a palha e lenha, para demonstrar que não iam aceitar as ameaças. Os jornalistas, que estavam na sede da Agropecuária Santa Bárbara, acompanharam o final da caminhada dos marchantes, que pediram para eles ficarem à frente para não atrapalhar a marcha. Não havia a intenção de fazer os jornalistas de “escudo humano”, até porque os trabalhadores não sabiam como seriam recebidos pelos seguranças. Aliás, os jornalistas que estavam no local foram levados de avião pela Agropecuária Santa Bárbara, o que demonstra que tinham tramado uma emboscada.

5- Os trabalhadores do MST não estavam armados e levavam apenas instrumentos de trabalho e bandeiras do movimento. Apenas um posseiro, que vive em outro acampamento na região, estava com uma espingarda. Quando a marcha chegou à guarita dos seguranças, os trabalhadores sem-terra foram recebidos a bala e saíram correndo – como mostram as imagens veiculadas pela TV Globo. Não houve um tiroteio, mas uma tentativa de massacre dos sem-terra pelos seguranças da Agropecuária Santa Bárbara.

6- Nove trabalhadores rurais ficaram feridos pelos seguranças da Agropecuária Santa Bárbara. O sem-terra Valdecir Nunes Castro, conhecido como Índio, está em estado grave. Ele levou quatro tiros, no estômago, pulmão, intestino e tem uma bala alojada no coração. Depois de atirar contra os sem-terra, os seguranças fizeram três reféns. Foram presos José Leal da Luz, Jerônimo Ribeiro e Índio.

7- Sem ter informações dos três companheiros que estavam sob o poder dos seguranças, os trabalhadores acampados informaram a Polícia Militar. Em torno das 19h30, os acampados fecharam a rodovia PA 150, na frente do acampamento, em protesto pela liberação dos três companheiros que foram feitos reféns. Repetimos: nenhum jornalista nem a advogada do grupo foram feitos reféns pelos acampados, mas permaneceram dentro da sede fazenda por vontade própria. Os sem-terra apenas fecharam a rodovia em protesto pela liberação dos três trabalhadores rurais feridos, como sustenta a Polícia Militar.

MOVIMENTOS DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA - PARÁ

SOMOS A FAVOR DA REFORMA AGRÁRIA E JUSTIÇA SOCIAL, SOMOS MST!


Caros companheiros, em virtude dos últimos acontecimentos envolvendo o movimento dos trabalhadores rurais sem terra o MST no estado do Pará e a grande ofensiva midiática promovida pelos grandes veículos de comunicação, em especial o da rede Globo, que fez uma nítida defesa dos jagunços do banqueiro bandido Daniel Dantas nossa organização Movimento Via Alternativa Socialista não poderia deixar de colocar a verdadeira versão dos fatos e prestar através do nosso blog nossa solidariedade aos compnheiros do MST. E deixar claro nosso compromisso com a defesa da luta pela reforma agrária. Somos MST!
Segue dois textos informativos e esclarecedores circuldos na rede após os acontecimentos ocoridos no Pará.

Rede Globo e Daniel Dantas: um caso de polícia
20/04/2009

Por Osvaldo da Costa


Não se trata de cobertura dos fatos, se trata de um ataque à consciência dos telespectadores. Na noite de 19 de abril, o programa de variedades Fantástico, da Rede Globo, apresentou uma suposta reportagem sobre um conflito ocorrido numa fazenda do Pará, envolvendo "seguranças" (o termo procura revestir de legalidade a ação de jagunços) da fazenda do banqueiro Daniel Dantas e militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Só pude descobrir que se tratava de propriedade do banqueiro processado por inúmeros crimes e protegido por Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, após ter vasculhado algumas páginas na internet em busca de meu direito de escutar o outro lado da notícia, a versão dos fatos dos sem terra, pois na reportagem eles aparecem como invasores, baderneiros, seqüestradores da equipe de reportagem da Rede Globo, assassinos em potencial, e ao final, corpos de militantes aparecem baleados no chão, agonizantes, sangrando, sem nenhum socorro, e a reportagem não fornece nenhuma informação sobre o estado de saúde das vítimas.

Sem ter acesso às causas do conflito, e a nenhum dos dois lados envolvidos, o telespectador se vê impelido a acompanhar o julgamento que o narrador da reportagem e a câmera nos sugere. No caso, tendemos a concordar com a punição dada aos desordeiros: “que sangrem até morrer!”, ou “quem mandou brincar com fogo?!” podem ser algumas das bárbaras conclusões inevitáveis a que os telespectadores serão levados à chegar.

Nós, em nossas casas, consumidores do que a televisão aberta nos apresenta, não temos direito ao juízo crítico, porque o protocolo básico das regras do jornalismo não é mais cumprido. Nós somos atacados em nosso direito de receber informações e emitir julgamentos, nós somos saqueados por emissoras privadas que mobilizam nosso sentimento de medo, ódio e desprezo, para em seguida nos exigir sorrisos com a próxima reportagem.

Como um exercício de manutenção da capacidade de reflexão, precisamos nominar esse tipo de ataque fascista com os termos que ele exige. A ilusão de verdade deve ser desmontada, a suposta neutralidade deve ser desmascarada, caso a caso, na medida de nossas forças.

Seguem questionamentos à reportagem, com o intuito de expor o arbítrio de classe da Rede Globo, para que esse texto possa endossar a documentação que denuncia a irregularidade das emissoras privadas e protesta contra a manutenção de concessões públicas para empresas que não cumprem com as leis do setor.

1º) Por que a Globo protege Dantas? Por que a emissora não tornou evidente que as terras pleiteadas pelo MST para Reforma Agrária são de Daniel Dantas? Qual o grau de envolvimento da emissora nas manobras ilícitas do banqueiro?

2°) Por que o MST não foi escutado na reportagem? Quais os motivos do movimento para decidir ocupar aquela fazenda?

3°) As imagens contradizem os fatos. A câmera da equipe de reportagem aparece sempre posicionada atrás dos seguranças da fazenda, e nunca à frente dos sem terra.

E vejam informação da Agência Estado: “A polícia de Redenção informou a Puty [Cláudio Puty, chefe da Casa Civil do governo do Pará] não ter havido cárcere privado de jornalistas e funcionários da Agropecuária Santa Bárbara, pertencente ao grupo do banqueiro Daniel Dantas e que tem 13 fazendas invadidas e ocupadas pelo MST. Os jornalistas, porém, negam a versão da polícia e garantem que ficaram no meio do tiroteio entre o MST e seguranças da fazenda” (http://br.noticias.yahoo.com/s/19042009/25/manchetes-pm-desarmar-mst-segurancas-no.html). Quer dizer, nem mesmo os grandes jornais conservadores estão fazendo coro com a cobertura extremamente parcial da Rede Globo.

4°) Ocorreu um tiroteio mesmo? Só aparecem os jagunços da fazenda atirando, e com armas de calibre pesado. E a imagem dos feridos mostra os sem terra baleados e um jagunço de pé, com pano na cabeça, possivelmente contendo sangramento de ferimento não causado por arma de fogo, dado o estado de saúde do homem.

5º) Por que os feridos não são tratados com o mesmo direito à humanidade que as vítimas de classe média da violência urbana? Eles não têm nomes? O que aconteceu com eles? Algum morreu? Quem prestou socorro? Em que hospital estão? Por que essas informações básicas foram omitidas?

6°) Por que mostrar como um troféu a agonia de seres humanos sangrando no chão, sem nenhum socorro?

quarta-feira, 8 de abril de 2009


*DO MUNDO VIRTUAL AO ESPIRITUAL*
Por Frei Betto

Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do
Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens
serenos, comedidos, recolhidos em paz em seus mantos cor de
açafrão.
Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São
Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones
celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do
que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em
casa, mas como a companhia aérea oferecia outro café, todos
comiam vorazmente. Aquilo me fez refletir: 'Qual dos dois
modelos produz felicidade?'
Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e
perguntei: 'Não foi à aula?' Ela respondeu: 'Não, tenho aula
à tarde'. Comemorei: 'Que bom, então de manhã você pode
brincar, dormir até mais tarde'. 'Não', retrucou ela, 'tenho
tanta coisa de manhã...'. 'Que tanta coisa?', perguntei.
'Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina', e começou a
elencar seu programa de garota robotizada.
Fiquei pensando: 'Que pena, a Daniela não disse: 'Tenho aula
de meditação!'
Estamos construindo super-homens e supermulheres totalmente
equipados, mas emocionalmente infantilizados. Por isso as
empresas consideram agora que, mais importante que o QI, é a
IE, a Inteligência Emocional. Não adianta ser um
superexecutivo se não se consegue se relacionar com as
pessoas. Ora, como seria importante os currículos escolares
incluírem aulas de meditação!
Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em
1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem
sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho
nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a
desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo,
vamos todos morrer esbeltos: 'Como estava o defunto?'.
'Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!' Mas como fica
a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da
ociosidade amorosa?
Antes, falava-se em realidade: análise da realidade,
inserir-se na realidade, conhecer a realidade. Hoje, a
palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Pode-se fazer sexo
virtual pela internet: não se pega aids, não há envolvimento
emocional, controla-se no mouse. Trancado em seu quarto, em
Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem
nenhuma preocupação de conhecer o seu vizi­nho de prédio ou
de quadra! Tudo é virtual, entramos na virtualidade de todos
os valores, não há compromisso com o real! É muito grave
esse processo de abstração da linguagem, de sentimentos:
somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos
virtuais. Enquanto isso, a realidade vai por outro lado,
pois somos também eticamente virtuais.
A cultura começa onde a natureza termina. Cultura é o
refinamento do espírito. Televisão, no Brasil - com raras e
honrosas exceções -, é um problema: a cada semana que passa,
temos a sensação de que ficamos um pouco menos cultos.
A palavra hoje é 'entretenimento'; domingo, então, é o dia
nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador,
imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem
perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não
consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade
é o resultado da soma de prazeres: 'Se tomar este
refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa, comprar
este carro, você chega lá!' O problema é que, em geral, não
se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que
acaba precisando de um analista. Ou de remédios. Quem
resiste, aumenta a neurose. Os psicanalistas tentam
descobrir o que fazer com o desejo dos seus pacientes.
Colocá-los onde? Eu, que não sou da área, posso me dar o
direito de apresentar uma sugestão. Acho que só há uma
saída: virar o desejo para dentro. Porque, para fora, ele
não tem aonde ir! O grande desafio é virar o desejo para
dentro, gostar de si mesmo, começar a ver o quanto é bom ser
livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal,
consumista.
Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde
mental três requisitos são indispensáveis: *amizades,
auto-estima, ausência de estresse*.
Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno. Se alguém
vai à Europa e visita uma pequena cidade onde há uma
catedral, deve procurar saber a história daquela cidade - a
catedral é o sinal de que ela tem história. Na Idade Média,
as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje,
no Brasil, constrói-se um shopping center. É curioso: a
maioria dos shopping centers tem linhas arquitetônicas de
catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer
maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingos. E ali
dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos,
crianças de rua, sujeira pelas calçadas...
Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano
pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista.
Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os
veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas
sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino
dos céus. Se deve passar cheque pré-datado, pagar a crédito,
entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se
não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno...
Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna,
irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo
hambúrguer do McDonald's.
Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das
lojas: '*Estou apenas fazendo um passeio socrático*.' Diante
de seus olhares espantados, explico: 'Sócrates, filósofo
grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o
centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o
assediavam, ele respondia: *Estou apenas observando quanta
coisa existe de que não preciso para ser feliz*.'

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Direito à memória e à mentira?


Por Renato Simões*

Hoje, o Brasil volta seus olhos para 45 anos atrás. Entre 31 de março e 1º de abril de 1964, forças militares deram o golpe de Estado que abriu um período de 21 anos de ditadura.
Durante décadas, partidos de esquerda, movimentos sociais, pequenos e combativos grupos de ex-presas e presos políticos, movimentos de direitos humanos, Igrejas progressistas e uns poucos mais mantiveram erguida a bandeira do direito à memória e à verdade. Para as elites econômicas que conceberam e financiaram o golpe, para os setores reacionários da mídia e das Igrejas que o prepararam e justificaram, para os militares que dele participaram e de cujas benesses usufruíram, a palavra de ordem era simplesmente o esquecimento.
Vez por outra, esse esquecimento pretendido era quebrado por uma ou outra manifestação isolada de vozes militares não-oficiais. Falar sobre o assunto já incomodava, dar explicações sobre o passado era ficar numa defensiva quase envergonhada. Afinal de contas, construiu-se desde as negociações sobre a Lei de Anistia de 1979, que fará 30 anos neste 2009, o argumento de que "anistia era para os dois lados, precisamos agora olhar para a frente". Tradição imposta pela correlação de forças naquele período da ditadura, sintetizada na versão oficial e jurídica do esquecimento.
Ao longo dos anos de conquistas democráticas, foi ficando insustentável a retranca do esquecimento. As manifestações de defesa da ditadura e do arbítrio foram ganhando uns poucos aliados em setores direitistas das Forças Armadas. Uma ou outra Ordem do Dia no "aniversário da Revolução" era divulgada para sinalizar que ainda havia na alta caserna sentimentos de defesa deste período triste da história. Alguns militares da ativa passaram a participar, de forma mais ou menos ostensiva, de atos promovidos por clubes militares e outras organizações da velha guarda.
A disputa pela história, a reconstituição de uma época que já estava com sua historiografia oficial consolidada, as conquistas de reparação moral, política e financeira no plano legislativo e da ação executiva federal e dos Estados, as primeiras ações de responsabilização de torturadores pelo assassinato e danos físicos e morais às pessoas torturadas, o compromisso do governo federal (tanto na gestão FHC quanto na gestão Lula) de avançar na sua política de direitos humanos, tudo isso contribuiu para o atual grau de acirramento de ânimos que cerca a fatídica data do 31 de março/1º de abril.
Livros, teses de mestrado e doutorado, filmes, peças de teatro, editoriais de jornais, matérias jornalísticas na TV, eventos públicos estão hoje marcados pela polêmica. Avança a luta pelo direito à memória e à verdade. No plano internacional, consolidam-se decisões, como a da Corte Interamericana de Direitos Humanos, de que crimes contra a humanidade, e a tortura em particular, são imprescritíveis. Em outros países sul-americanos caem anistias autoconcedidas pelos outrora vitoriosos golpistas. Agora, no começo deste mesmo mês de março de 2009, a Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) aprovou este mesmo entendimento jurídico, já adotado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em recente ação movida junto ao Supremo Tribunal Federal (STF): "Na presente quadra histórica de nossa já consolidada democracia, não consideramos adequada uma leitura da Lei de Anistia que abrigue excludentes de responsabilidade dos agentes que praticaram crimes contra a humanidade no período da ditadura militar", diz a AMB.
A opinião expressa inúmeras vezes pelos ministros Tarso Genro e Paulo Vanucchi nesta mesma direção ganha corpo no interior do atual governo, ainda que vozes discordantes empalideçam o debate com argumentos obscurantistas. Mas está assentada nos compromissos de educação para os direitos humanos a principal diretriz, da qual a responsabilização dos agentes é mero instrumento, a de destampar a panela de pressão em que se transformou o silêncio sobre esse período, e liberar toda uma reflexão crítica sobre essa história que nos assegure, no presente e no futuro, que a democracia e os direitos fundamentais da pessoa humana não sejam atingidos pela truculência de golpes de Estado e da violência institucional.
Hoje, a verdade continuará vencendo a mentira. O 1º de abril não será mais do que brincadeira para pregar peças aos amigos. O 31 de Março será revisitado, todos defendendo o direito à memória, enquanto alguns lutarão pelo direito à verdade, e outros lutarão pelo privilégio da mentira.

*Renato Simões é secretário nacional de Movimentos Populares do PT.
Artigo publicado originalmente no Jornal do Brasil, edição de 31/03/2009.