sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Lula lembra dos tempos do pensamento subalterno, da Petrobrax



Se os tucanos tivessem ganhado em 2002, hoje provavelmente a festa do pré-sal seria no Texas, ou em Cingapura - na sede da empresa que teria assumido o controle da Petrobrax. Os tempos do "pensamento subalterno", os tempos de tirar os sapatos para os Estados Unidos, esses ficaram pra trás. "Altas personalidades naqueles anos chegaram a dizer que a Petrobras era um dinossauro – mais precisamente, o último dinossauro a ser desmantelado no país. E, se não fosse a forte reação da sociedade, teriam até trocado o nome da empresa", disse o presidente Lula no lançamento do pré-sal. O artigo é de Rodrigo Vianna

Rodrigo Vianna

Artigo publicado originalmente no blog O Escrevinhador, de Rodrigo Vianna:

Lula mostrou estatura de estadista no discurso de segunda-feira, no lançamento do pré-sal. Mostrou à nação o que está em jogo hoje no Brasil.

Lula colou na testa dos tucanos o rótulo de "adoradores do mercado". Lembrou que eles queriam "desmontar a Petrobrás".

Lula mostrou que não é preciso chamar a neo-UDN de "entreguista", como se dizia nos anos 50/60.

Basta lembrar que a neo-UDN tucana chamava a Petrobrás de "dinossauro, que precisava ser desmantelado".

Foi o que Lula fez em seu discurso histórico. Um discurso que não foi de improviso, mas cuidadosamente escrito para se transformar em um documento histórico.

E ainda há quem defenda a tese esdrúxula de que "não há diferença entre Lula e FHC". Se os tucanos tivessem ganhado em 2002, hoje provavelmente a festa do pré-sal seria no Texas, ou em Cingapura - na sede da empresa que teria assumido o controle da Petrobrax.

Os tempos do "pensamento subalterno", os tempos de tirar os sapatos para os Estados Unidos, esses ficaram pra trás.

Vejam como Lula - no discurso histórico - se refere àqueles tempos que não voltam mais:

"Estamos vivendo hoje um cenário totalmente diferente daquele que existia em 1997, quando foi aprovada a Lei 9.478, que acabou com o monopólio da Petrobras na exploração do petróleo e instituiu o modelo de concessão.

Naquela época, o mundo vivia um contexto em que os adoradores do mercado estavam em alta e tudo que se referisse à presença do Estado na economia estava em baixa. Vocês devem se lembrar como esse estado de espírito afetou o setor do petróleo no Brasil. Altas personalidades naqueles anos chegaram a dizer que a Petrobras era um dinossauro – mais precisamente, o último dinossauro a ser desmantelado no país. E, se não fosse a forte reação da sociedade, teriam até trocado o nome da empresa. Em vez de Petrobras, com a marca do Brasil no nome, a companhia passaria a ser a Petrobrax – sabe-se lá o que esse xis queria dizer nos planos de alguns exterminadores do futuro.

Foram tempos de pensamento subalterno. O país tinha deixado de acreditar em si mesmo. Na economia, campeava o desalento. O Brasil não conseguia crescer, sofria com altas taxas de juros, de desemprego, e juros estratosféricos, apresentava dívida externa elevadíssima e praticamente não tinha reservas internacionais. Volta e meia quebrava, sendo obrigado a pedir ao FMI ajuda, que chegava sempre acompanhada de um monte de imposições.

Além disso, não produzíamos o petróleo necessário para nosso consumo. Ferida, desestimulada e desorientada, a Petrobras vivia um momento muito difícil."

Veja a seguir a íntegra do discurso do presidente Lula:

Hoje é um dia histórico.

O governo está enviando ao Congresso Nacional sua proposta do marco regulatório para a exploração de petróleo e gás no chamado pré-sal.

Estou seguro de que, nos próximos meses, os deputados e senadores, recolhendo também as contribuições de governadores e prefeitos, aperfeiçoarão as propostas do governo, trabalhando com responsabilidade, espírito público, compromisso com o país e, sobretudo, muita visão de futuro.

Estou seguro também de que o povo brasileiro entrará de corpo e alma nesse debate tão importante para o destino do Brasil e para o futuro dos nossos filhos.

Porque esse não é um assunto apenas para os iniciados e especialistas. Nem é tampouco um tema que deva ficar restrito somente ao parlamento. Ao contrário, ele interessa a todos e depende de todos.

Por isso mesmo, quero convocar cada brasileiro e cada brasileira a participar desse grande debate. Trabalhadores, donas de casa, lavradores, empresários, intelectuais, cientistas, estudantes, servidores públicos, todos podem e devem contribuir para que tomemos as melhores decisões.

Minhas amigas e meus amigos,

O chamado pré-sal contém jazidas gigantescas de petróleo e gás, situadas entre cinco e sete mil metros abaixo do nível do mar, sob uma camada de sal que, em certas áreas, alcança mais de 2 mil metros de espessura.

Não se pode ainda dizer, com certeza, quantos bilhões de barris o pré-sal acrescentará às reservas brasileiras. Mas já se pode dizer, com toda segurança, que ele colocará o Brasil entre os países com maiores reservas de petróleo do mundo.

Trata-se de uma das maiores descobertas de petróleo de todos os tempos. E em condições extremamente importantes: as reservas encontram-se num país de grandes dimensões, de grande população e de abundantes recursos naturais. Um país que conta com um regime político estável e instituições democráticas em pleno funcionamento. Um país pacífico que faz questão de viver em paz com seus vizinhos. Um país que possui uma economia sofisticada, com um parque industrial diversificado, uma agropecuária de ponta e um setor de serviços moderno. Um país que, tendo dado passos importantes na superação das desigualdades sociais, encontrou seu caminho e está maduro para dar um salto no desenvolvimento.

Como já disse em outra oportunidade, o pré-sal é uma dádiva de Deus. Sua riqueza, bem explorada e bem administrada, pode impulsionar grandes transformações no Brasil, consolidando a mudança de patamar de nossa economia e a melhoria das condições de vida de nosso povo.

Mas o pré-sal também apresenta perigos e desafios. Se não tomarmos as decisões acertadas, aquilo que é um bilhete premiado pode transformar-se em fonte de enormes problemas. países pobres que descobriram muito petróleo, mas não resolveram bem essa questão, continuaram pobres.

Outros caíram na tentação do dinheiro fácil e rápido. Passaram a exportar a toque de caixa todo o óleo que podiam e foram inundados por moedas estrangeiras. Resultado: quebraram suas indústrias e desorganizaram suas economias. E, assim, o que era uma dádiva transformou-se numa verdadeira maldição.

Para evitar esse risco, desde o primeiro instante, determinei à comissão de ministros que preparou o marco regulatório do pré-sal que trabalhasse em cima de três diretrizes básicas.

Primeira: o petróleo e o gás pertencem ao povo e ao Estado, ou seja, a todo o povo brasileiro. E o modelo de exploração a ser adotado, num quadro de baixo risco exploratório e de grandes quantidades de petróleo, tem de assegurar que a maior parte da renda gerada permaneça nas mãos do povo brasileiro.

A segunda diretriz é de que o Brasil não quer e não vai se transformar num mero exportador de óleo cru. Ao contrário, vamos agregar valor ao petróleo aqui dentro, exportando derivados, como gasolina, óleo diesel e produtos petroquímicos, que valem muito mais. Vamos gerar empregos brasileiros e construir uma poderosa indústria fornecedora dos equipamentos e dos serviços necessários à exploração do pré-sal.

A terceira diretriz: não vamos nos deslumbrar e sair por aí, como novos ricos, torrando dinheiro em bobagens. O pré-sal é um passaporte para o futuro. Sua principal destinação deve ser a educação das novas gerações, a cultura, o meio ambiente, o combate à pobreza e uma aposta no conhecimento científico e tecnológico, por meio da inovação. Vamos investir seus recursos naquilo que temos de mais precioso e promissor: nossos filhos, nossos netos, nosso futuro.

Ao examinar os projetos de lei que estamos enviando hoje ao Congresso, depois de tanto trabalho e estudo, vejo com satisfação que eles estão em perfeita sintonia com essas diretrizes.

Minhas amigas e meus amigos,

Uma mudança importante no marco regulatório será a adoção do modelo de partilha de produção no pré-sal e em outras áreas de potencial e características semelhantes. É uma mudança absolutamente necessária e justificada.

Estamos vivendo hoje um cenário totalmente diferente daquele que existia em 1997, quando foi aprovada a Lei 9.478, que acabou com o monopólio da Petrobras na exploração do petróleo e instituiu o modelo de concessão.

Naquela época, o mundo vivia um contexto em que os adoradores do mercado estavam em alta e tudo que se referisse à presença do Estado na economia estava em baixa. Vocês devem se lembrar como esse estado de espírito afetou o setor do petróleo no Brasil. Altas personalidades naqueles anos chegaram a dizer que a Petrobras era um dinossauro – mais precisamente, o último dinossauro a ser desmantelado no país. E, se não fosse a forte reação da sociedade, teriam até trocado o nome da empresa. Em vez de Petrobras, com a marca do Brasil no nome, a companhia passaria a ser a Petrobrax – sabe-se lá o que esse xis queria dizer nos planos de alguns exterminadores do futuro.

Foram tempos de pensamento subalterno. O país tinha deixado de acreditar em si mesmo. Na economia, campeava o desalento. O Brasil não conseguia crescer, sofria com altas taxas de juros, de desemprego, e juros estratosféricos, apresentava dívida externa elevadíssima e praticamente não tinha reservas internacionais. Volta e meia quebrava, sendo obrigado a pedir ao FMI ajuda, que chegava sempre acompanhada de um monte de imposições.

Além disso, não produzíamos o petróleo necessário para nosso consumo. Ferida, desestimulada e desorientada, a Petrobras vivia um momento muito difícil. Tinha dificuldades de captação externa e não contava com recursos próprios para bancar os investimentos. Nessa época, é bom lembrar – e a Dilma já falou – o preço do barril do petróleo estava em torno de US$ 19.

Hoje, nós vivemos um quadro é inteiramente diferente. Em primeiro lugar, os países e os povos descobriram na recente crise financeira internacional que, sem regulação e fiscalização do Estado, o deus-mercado é capaz de afundar o mundo num abrir e fechar de olhos. O papel do Estado, como regulador e fiscalizador, voltou, portanto, a ser muito valorizado.

A economia do Brasil vive também um novo momento. De 2003 a 2008, crescemos em média, 4,1% ao ano. Nos últimos dois anos, nosso crescimento foi superior a 5%. Nesse período, o país gerou cerca de onze milhões de empregos com carteira assinada. O desemprego caiu de 11,7% para 8%, em 2008. Hoje, as taxas de juros atuais são as menores de muitas décadas em nosso país.

Não só pagamos a dívida externa pública, como acumulamos reservas superiores a US$ 215 bilhões. E mais: reduzimos de modo consistente a miséria e as desigualdades sociais. Mais de 30 milhões de brasileiros saíram da linha da pobreza e 2 milhões ingressaram... e 20 milhões ingressaram na nova classe média, fortalecendo o mercado interno e dando vigoroso impulso à nossa economia.

O fato é que hoje temos uma economia organizada, pujante e voltada para o crescimento. Uma economia que foi testada na mais grave crise internacional desde 1929 e saiu-se muito bem na prova. Não só não quebramos, como fomos um dos últimos países a entrar na crise e estamos sendo um dos primeiros a sair dela. Antes, éramos alvo de chacotas e de imposições. Hoje, nossa voz, a voz do Brasil, é ouvida lá fora com muita atenção e com muito respeito.

Meus queridos companheiros e companheiras,

Desde o primeiro instante, meu governo deu toda força à Petrobras. Passamos a cuidar com muito carinho do nosso querido dinossauro. Os recursos da empresa destinados à pesquisa e ao desenvolvimento deram um salto de US$ 201 milhões, em 2003, para R$ 960 milhões, em 2008.

A companhia voltou a investir, aumentou a produção, abriu concursos para contratação de funcionários, encomendou plataformas, modernizou e ampliou refinarias, além de construir uma grande infra-estrutura de gás natural e entrar também na era de biocombustíveis.
Deixamos claro que nossa política era fortalecer, e não debilitar, a Petrobras. E a companhia – estimulada, recuperada e bem comandada – reagiu de forma impressionante.

Resultado: a Petrobras vive hoje um momento singular. É o orgulho do país. É a maior empresa do Brasil. É a quarta maior companhia do mundo ocidental. Entre as grandes petroleiras mundiais, é a segunda em valor de mercado. É um exemplo em tecnologia de ponta. Descobriu as reservas do pré-sal, um feito extraordinário, que encheu de admiração o mundo e de muito orgulho os brasileiros. É uma empresa com crédito e autoridade internacionais. Tanto que, nos últimos meses, levantou cerca de US$ 31 bilhões em empréstimos. Seus investimentos previstos até 2013 somam US$ 174 bilhões.

E ainda para ajudar, para completar, o preço do barril de petróleo oscila hoje em torno de US$ 65, mais do triplo do que em 1997.

Em suma, os tempos e o ambiente no mundo são outros. A situação da economia brasileira é outra. O Brasil e o prestígio do Brasil são outros. A Petrobras é outra. E outra também é a situação do mercado do petróleo.

Minhas amigas e meus amigos,

Também não há termos de comparação entre as áreas que vinham sendo exploradas até agora e as áreas do pré-sal.

No pré-sal, os riscos exploratórios são baixíssimos. A taxa de sucesso dos poços operados pela Petrobras na área é de 87%, sendo que nos blocos situados na Bacia de Santos ela é de 100%. Foram 13 poços perfurados. E nos 13 comprovou-se a existência de grandes quantidades de óleo e gás, com excelentes perspectivas de viabilidade econômica.

Nessas circunstâncias, seria um grave erro manter na área do pré-sal, de baixíssimo risco e grande rentabilidade, o modelo de concessões, apropriado apenas para blocos de grande risco exploratório e baixa rentabilidade.

No modelo de concessões, a União, proprietária do subsolo, permite que as companhias privadas procurem petróleo, mediante o pagamento de uma taxa chamada bônus de assinatura. Se elas encontrarem óleo ou gás, podem extraí-lo e comercializá-lo como quiserem. São donas do petróleo arrancado das entranhas da terra, porque, a partir da boca do poço, a União perde os direitos de propriedade, recebendo apenas uma parcela pequena da renda do petróleo, na forma de royalties e participações especiais.

Já no modelo de partilha, que prevalece em todo o mundo em áreas de baixo risco exploratório e grande rentabilidade, a União continuará dona da maior parte do petróleo e do gás mesmo depois de sua extração. Nesse modelo, o Estado não transfere toda a propriedade do óleo para grupos privados, mas fecha contratos para a exploração e a produção em determinada área – diretamente com a Petrobras ou, mediante licitação, no caso de outras companhias.

No modelo de partilha, as empresas são remuneradas com uma parcela do óleo extraído, suficiente para cobrir seus custos e investimentos e ainda proporcionar uma rentabilidade adequada ao risco do projeto. Já o Estado fica com a maior parte dos lucros da exploração e produção de petróleo, parte esta bem superior ao que recebe hoje no regime de concessão. A regra do modelo de partilha é clara: nas licitações, vence a empresa que oferecer a maior parcela do lucro da operação para o Estado e para o povo brasileiro.

Amigas e amigos,

Como no modelo de partilha a maior parte do petróleo, mesmo depois de extraído, continuará a pertencer ao Estado, ela controlará o processo de produção. Assim, ela poderá definir claramente o ritmo de extração, calibrando-o de acordo com os interesses nacionais, sem se subordinar às exigências do mercado. Dessa maneira, ficará mais fácil para o Brasil contornar os riscos inerentes à produção excessiva, que poderia inundar o país de dinheiro estrangeiro, desorganizando nossa economia – aquilo que os especialistas chamam de doença holandesa.

Além disso, poderemos produzir petróleo nas condições que mais convêm ao país. E desse modo poderemos aproveitar a riqueza do petróleo, que Deus nos deu, para produzir mais riqueza ainda com o nosso trabalho.

Dessa forma, consolidaremos uma poderosa e sofisticada indústria petrolífera, promoveremos a expansão da nossa indústria naval e converteremos o Brasil num dos maiores pólos mundiais da indústria petroquímica do mundo.

Trabalhando com essa perspectiva, encomendaremos – e produziremos aqui dentro – milhares e milhares de equipamentos, gerando emprego, salário e renda para milhões de brasileiros.

Minhas amigas e meus amigos,

Para gerir os contratos de partilha e os contratos de comercialização de petróleo e gás, zelando pelos interesses do Estado e do povo brasileiro, estamos criando uma nova empresa estatal na área do petróleo, a Petrosal.

Ela não concorrerá com a Petrobras, já que não participará da prospecção ou da exploração de petróleo e gás. Sua missão é inteiramente diferente. A nova estatal será, isso sim, a representante dos interesses do Estado brasileiro, o olho atento do povo brasileiro, acompanhando e fiscalizando a execução dos contratos firmados na área do pré-sal.

Será uma empresa enxuta, com corpo técnico altamente qualificado, formado por profissionais com experiência comprovada. Em vários países que adotaram o modelo de partilha, empresas com esse caráter revelaram-se imprescindíveis para defender os interesses públicos e nacionais nas negociações e na gestão de contratos e processos complexos e sofisticados como os que caracterizam a indústria petrolífera.
Minhas amigas e meus amigos,

Se vocês estão cansados, imaginem eu. Outra novidade importante é a criação do Fundo Social. Ele será responsável pela administração da renda do petróleo e pela sua aplicação em investimentos seguros e de boa rentabilidade, tanto no Brasil como no exterior.

De um lado, o novo fundo será uma mega-poupança, um passaporte para o futuro, que preservará e incrementará a renda do petróleo por muitas e muitas décadas. Os rendimentos do fundo serão canalizados, prioritariamente, para a educação, a cultura, o meio ambiente, a erradicação da pobreza e a inovação tecnológica. Vamos aproveitá-los para pagar a imensa dívida que o país tem com a educação e para permitir que a aplicação do conhecimento científico seja, na verdade, a nossa maior garantia do nosso futuro.

De outro lado, o novo fundo funcionará, também, como um dique contra a entrada desordenada de dinheiro externo, evitando seus efeitos nocivos e garantindo que nossa economia siga saudável, forte e baseada no trabalho e no talento dos milhões e milhões de brasileiros.

Assim, a renda gerada pela produção do pré-sal será administrada de forma planejada e inteligente. E seu ingresso na economia nacional será dosado de modo a fortalecê-la e a impulsioná-la, jamais a desorganizá-la.
Minhas amigas e meus amigos,

Não poderia deixar de prestar aqui uma sincera homenagem à Petrobras, a sua diretoria e a todo o seu corpo de funcionários.

A descoberta do pré-sal, que coloca o Brasil num novo patamar no cenário mundial, não foi fruto do acaso ou de um golpe de sorte. Ao contrário, ela só foi possível graças ao talento, à competência e à determinação da Petrobras. E também, é claro, graças ao revigoramento da empresa nos últimos anos, à recuperação da sua autoestima e aos investimentos crescentes em pesquisa e prospecção.

Poucas empresas no mundo têm hoje a experiência da Petrobras na exploração de petróleo em águas profundas e ultraprofundas. E nenhuma empresa petrolífera conhece e é capaz de obter resultados tão expressivos em nossa plataforma submarina como ela. Trata-se de um ativo, de um patrimônio de enorme valor, que deve ser bem e de forma extraordinária aproveitado.

Por isso mesmo, a Petrobras terá um status especial no marco regulatório do pré-sal. Será a única empresa operadora nessa província. Outras empresas poderão ter participação, inclusive majoritária, nos consórcios que explorarão os blocos contratados. Mas a operação – vale dizer, a exploração, o desenvolvimento, a produção e a desativação das instalações – estará sempre a cargo da nossa querida e orgulhos Petrobras.

Além disso, as reservas do pré-sal, que pertencem ao Estado e ao povo brasileiro, oferecem uma excelente oportunidade para que a União fortaleça a Petrobras para enfrentar os novos desafios. Nesse sentido, estamos enviando projeto de lei ao Congresso Nacional autorizando a União a promover aumento de capital da companhia. O valor total do aumento de capital será aquilo que a ministra Dilma já falou, de até cinco bilhões de barris equivalentes de petróleo, obviamente, relativos às jazidas contíguas às áreas que a empresa já detém no pré-sal.

Nos termos da lei, os acionistas minoritários que desejarem participar dessa chamada de capital poderão adquirir ações da companhia, o que contribuirá para reforçar economicamente nossa maior empresa nesse momento decisivo.

Se os acionistas minoritários não exercerem integralmente seus direitos de opção, a capitalização promovida pela União implicará aumento da participação do povo brasileiro no capital total da Petrobras.

Minhas amigas e meus amigos,

Nesse momento em que o Brasil discute o melhor caminho para se tornar um grande produtor mundial de petróleo, quero render minhas homenagens a todos os brasileiros que lutaram para que este sonho se transformasse em realidade.

Em primeiro lugar, homenageio os que acreditaram quando era mais fácil descrer. E não deram ouvidos às aves de mau agouro que, durante décadas, apregoaram aos quatro ventos que o Brasil não tinha petróleo. Foram, por isso, chamados de fanáticos e maníacos. Ainda bem que houve fanáticos que nos ensinaram a duvidar dos preconceitos e a ter fé em nossas próprias forças.

Rendo minha homenagem também aos que se insurgiram contra a ladainha que proclamava que, mesmo que o Brasil tivesse petróleo, não teria competência para explorá-lo. E que deveria deixar essa tarefa para o capital estrangeiro. Muitos foram tachados de lunáticos, prisioneiros de uma idéia fixa, como o grande e saudoso Monteiro Lobato, porque teimaram em lutar para que o Brasil explorasse suas riquezas. Benditos lunáticos que ensinaram o país a enxergar longe, em tempos de escuridão, e iluminaram os caminhos dos que vieram depois.

Rendo minha homenagem ainda aos que saíram às ruas em todo o país na campanha do “O Petróleo é nosso”, levando o presidente Getúlio Vargas a instituir o monopólio estatal do petróleo e a criar a Petrobras. Foi uma batalha travada em condições duríssimas. Basta ler os jornais da época, alguns em circulação até hoje, que ridicularizavam a campanha nacionalista. E eu digo: bendito nacionalismo, que permitiu que as riquezas da nação permanecessem em nossas mãos.

Rendo homenagem muito especial, por fim, a todos os que defenderam a Petrobras quando ela foi atacada ao longo de sua história – e ainda hoje – e aos funcionários e petroleiros que se mantiveram de pé quando a empresa passou a ser tratada como uma herança maldita do período jurássico. Benditos amigos e companheiros do dinossauro, que sobreviveu à extinção, deu a volta por cima, mostrou o seu valor. E descobriu o pré-sal – patrimônio da União, riqueza do Brasil e passaporte para o nosso futuro.

Olho para trás e vejo que há algo em comum em todos esses momentos, algo que unifica e dá sentido a essa caminhada, algo que nos trouxe até aqui e ao dia de hoje: é, sinceramente, a capacidade do povo brasileiro de acreditar em si mesmo e no nosso país. Foi em meio à descrença de tantos que querem falar em seu nome... O povo – principalmente ao povo – devemos esse momento atual.

É como se houvesse uma mão invisível – não a do mercado, da qual já falaram tanto, mas outra, bem mais sábia e permanente, a mão do povo – tecendo nosso destino e construindo nosso futuro. Não creio que seja uma coincidência o fato de a Petrobras ter descoberto as grandes reservas do pré-sal justamente num momento da vida política nacional em que o povo também descobriu em si mesmo grandes reservas de energia e de esperança. Num momento em que o país, deixando para trás o complexo de inferioridade que lhe inculcaram durante séculos, aprendeu como é bom andar de cabeça erguida e olhar com confiança para o futuro.

Muito obrigado, companheiros."

sexta-feira, 31 de julho de 2009

DO FORNO!!!


Nova poesia do Valmir Jordão, uma bela novidade para comesarmos bem o mês, o poeta continua no auge de sua criação e surpreendendo a cada poesia como sempre visceral e urbana, desta vez ataca com este belíssimo poema "aos pariceiros dos anos 80" poesia carregada de urbanidade, provocação e uma sensibilidade política de adimirar. Bem, boa leitura e abraços a todos e todas.


Aos pariceiros dos anos 80

Eu vi os expoentes da minha geração consumindo muito álcool, na Hospício em busca da loucura,
chapando insistentemente no Beco da Fome para recitar na Sete de Setembro contra o auto otarismo
e o autoritarismo em voga,

andando pelas ruas da Boa Vista feito zumbis bêbados, ansiando fumar um nos miseráveis apartamentos
sem água e sem luz, flutuando sobre os tetos da cidade contemplando junkies que desnudaram seus
cérebros ao céu e, viram o CCC com as mãos sujas do sangue do Pe. Henrique,

cansados dos acadêmicos sem brilho, dissecando as almas dos poetas malditos, com toda a mediocridade
e arrogância dos que tentam apropiar-se do alheio,

enquanto Gregório de Matos, William Blake e Patativa do Assaré reluzem em outras dimensões,
éramos detidos e baculejados pela polícia suspeitos de vagabundagem e subversão,

e vi a juventude mergulhada nas drogas alopáticas, uns dependentes do Algafan, outros no éter e
no Pambenyl e mais alguns usando Cocaína ou Fiorinal para encontrar o seu próprio paraíso artificial,

presenciei o bardo Alberto da Cunha Melo a combater o regime de exceção na estrada do excesso
pois todo gênio que se preza, busca a sua garrafa, enquanto boa parte da sua geração camuflava-se
na aura da vaidade literária,

Erickson Luna com sua auto-flagelação nas drogas, no álcool e na anorexia das noites insones no
Cais de Santa Rita ou em Santo Amaro das Salinas, armado de copo na mão com aparência a esganar
o mundo e todo mundo, a dizer que a felicidade é apenas um golpe publicitário,

Espinhara espinhando as relações com o seu jeito espinhoso de ser, Lautreamont, Augusto dos Anjos,
Jean Genet e Chico Buarque foi o seu quarteto mais que fantástico, fora de si, tentou afogar-se na lama
mas a Buarque de Macedo rejeitou esta atitude, semeava o Lítero e colhia pessimismo com o seu mau humor
e machismo digno de um Bukovisk e, foi o poeta da flor e do espinho,

O comportamental França nos seus recitais notívagos e sedutores, a atrair burguesas branquelas com a sua
fala e o seu falo de ébano, a repetir quem quer querelas?

O deseducador cultural Jomard Muniz de Brito evocando Glauber e o Tropicalismo nordestinado contra a caretice
nos meios e nas mansardas recifenses, a quebrar tabus sendo eternamente Pagú e Papangu nos canaviais e carnavais
da Mauricéia travada pela burrice, mil vivas ao mau velhinho!

Fred Caminha nas pensões e manicômios, nos Coelhos e no Bairro do Recife ou na Palma em busca de uma
puta, uma carreira ou uma bola para rolar na Conde da Boa Vista, Príncipe ou Manoel Borba,

Jorge Lopes tatuando na própria alma seus desejos de sexo, drogas & rock and roll, da Caxangá a Riachuelo
na sua batalha diária contra a fome de viver, para não torna-se uma garatuja de si própio,

Vi Cida Pedrosa, Lara, Samuca, Miró e os Cavaleiros da Epifania a calvagar na Ilusão de Ética e na resenha
Interpoética sempre Amarginal,
Hector Pellizzi, Juhareiz Correya, Fátima Ferreira, Wilson Veira, Joca de Oliveira e Humberto Felipe ecoando
poemas no Savoy, no Calabouço,e na Livro 7 mostrando o quanto a América estava indignada,

e todos se reergueram no passo libertário do Frevo e na síncope do Maracatu e na batida literalmente do Côco,
provaram o vinho avinagrado dos tempos difíceis, mas mesmo assim deixando o que houve para ser dito no tempo
após a morte ...

Valmir Jordão

sexta-feira, 24 de julho de 2009


Caros Companheiros, a cobertura da grande mídia a respeito do 51° CONUNE expressa uma clara perseguição política contra os movimentos sociais que se colocam na luta política do povo e a favor das transformações que o país atravessa. Posto aqui este artigo que expressa nosso pensamento a cerca da cobertura preconceituosa da mídia e o papel histórico da UNE nas lutas do movimento estudantil brasileiro.
Vida longa à UNE.

A UNE é chapa branca?

Por *Gilson Caroni Filho
Do site Carta Maior

Quem analisa os movimentos sociais a partir de uma perspectiva que leva em conta a contingência e a subjetividade dos atores, sem esquecer os aspectos históricos e institucionais, não ignorou o objetivo do enquadramento da cobertura que a grande imprensa fez tanto do 51º Congresso da UNE ( União Nacional dos Estudantes) quanto da participação do presidente Lula em sua abertura.

O tom sarcástico dos títulos ("Patrocinada pela Petrobrás, UNE faz manifestação contra CPI"- Folha de São Paulo,16/7) e o coro unificado de articulistas, relacionando o patrocínio público a entidades estudantis com aparelhamento de sua pauta de reivindicações, não deixam margem para dúvidas: o Estado-Maior das redações não mediu esforços para projetar o movimento como setor social cooptado politicamente pelo governo.

Não foi gratuito o destaque dado ao “cândido" senador Cristovam Buarque (PDT-DF) que, contrapondo ingenuidade e oportunismo, afirmou que o " problema da UNE não é que tenha se vendido, mas sem dúvida se acomodou. Há um silêncio reverencial dos jovens que deveriam apoiar qualquer CPI". Perdeu uma ótima oportunidade de ficar calado.

Finge não saber que os movimentos sociais aprenderam a dialogar com o governo sem perder a autonomia, sua identidade específica. Ignora uma trajetória de lutas que sempre conjugou funcionamento democrático das instituições com a universalização do ensino superior público, a regulamentação do ensino privado e a garantia de métodos de avaliação socialmente referenciados. Graças a isso não caiu na armadilha neoliberal da “ideologia antiestal da liberdade" e, apesar do refluxo dos anos 1990, foi capaz de articular suas demandas específicas com a de outros setores.

O que o senador brasiliense e a imprensa parecem desconhecer é que no 47ª Congresso, realizado em 2001, o PSDB surgiu, como relata Clóvis Wonder para o jornal “A Classe Operária", pedindo " uma CPI para a UNE, com o objetivo claro de confundir os estudantes e abrir uma cortina de fumaça para proteger o governo FHC, saiu amplamente derrotado no congresso. Os estudantes majoritariamente rechaçaram suas intervenções no evento e derrotaram suas propostas". É estranho que Cristovam Buarque, então quadro político do PT, não soubesse que os jovens não apóiam qualquer CPI.

A UNE nasceu em 11 de agosto de 1937, coincidindo com a instauração do Estado Novo. Combater regimes autocráticos foi, desde sempre, sua marca constitutiva. Em 1947, no 10ª Congresso, os estudantes lançaram manifestos nacionalistas que dariam origem a uma das maiores campanhas popular do país: a do “O petróleo é nosso". Como conseqüência dessa mobilização, em 1953, seria criada a Petrobrás, empresa estatal que, até o governo tucano, detinha o monopólio da exploração do petróleo no Brasil. Há algum desvio quando a atual gestão se opõe a uma CPI que trará imensos danos à estatal? É a isso que a grande imprensa chama de direção chapa-branca? Esse é motivo da estupefação do sempre ético Cristovam?

Seus principais documentos sempre afirmavam que era necessário apoiar as empresas nacionais, dando-lhes privilégios em termos de crédito, legislação e recursos técnicos; reclamavam a realização de uma reforma agrária e o desenvolvimento do mercado interno como forma de estimular a economia brasileira. Uma questão fundamental para os interesses do país, segundo os estudantes, era a adoção de uma política externa independente.

Excetuando a questão agrária, onde ainda há muito que avançar, qual o motivo para a UNE se opor ao governo Lula? Projetos como o Reuni e o Prouni que, respectivamente, ampliam as universidades públicas e concedem bolsas em instituições de ensino privado a estudantes carentes não contemplam reivindicações antigas da entidade? Por que o diálogo desrespeita a autonomia que o movimento estudantil deve guardar em relação aos poderes instituídos?

Não deixa de ser engraçado como é articulada a crítica na grande imprensa. A base de comparação é sempre com uma “antiga UNE”, aquela que "orgulhava a cidadania". Seria o caso de perguntar quando surgiu essa admiração dos senhores da mídia pela organização ? Em 1964, estavam em lados opostos. Após sua reconstrução em 1979, ao contrário da grande mídia, a UNE marcou presença nos movimentos de oposição ao Regime Militar, lutando na campanha pela anistia. Em 1981, comandou uma greve nacional diante da recusa do Ministério da Educação em atender a uma pauta de reivindicações. Em 1984, enquanto as corporações midiáticas sabotavam a campanha das diretas-já, os estudantes engrossaram a mobilização popular. A grandeza da UNE se fez na contramão da pequenez de uma imprensa que teima em reescrever a história. E esse dado não é irrelevante para a apreensão da atual conjuntura.

O movimento estudantil não perdeu sua identidade. Como analisou a estudante de jornalismo, Débora Pereira, para a revista Carta Capital “a UNE deixou de fazer resistência ao projeto neoliberal para passar a fazer proposições. Mudou a relação do movimento social com o estado” Com isso ela não disse que cessaram agendas e temas de luta.

Estão presentes, como imperativos para a consolidação da democracia, a extinção do monopólio dos meios de comunicação, o fim da Desvinculação dos Recursos da União, a abertura imediata de todos os arquivos da ditadura militar e punição de todos os crimes cometidos pelo regime, entre outros. Essa agenda coincide com os editoriais de qual jornal? Quem define a cor da chapa? Qual a tonalidade de cada um?


*Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Juventude do PT lança manifesto aos participantes do 51º Congresso da UNE


A HORA É AGORA!

Fortalecer a UNE, a juventude e o povo

O 51º Congresso da UNE tem a tarefa de preparar a UNE e o movimento estudantil (ME) para a luta por uma universidade popular e democrática, o enfretamento à crise mundial do capitalismo e a disputa política e ideológica das eleições 2010.



Vivemos um momento decisivo para impedir qualquer possibilidade de retorno desastroso dos Demo-Tucanos, representantes dos setores conservadores e monopolistas responsáveis pelo sucateamento da universidade pública brasileira e por abrir as portas para exploração da educação no mercado. É preciso lutar por um terceiro mandato para o PT e o campo democrático popular buscando aprofundar as transformações em curso rumo à superação do neoliberalismo e do capitalismo para construir uma sociedade socialista.



Se há dez anos atrás, durante o Governo FHC, fazíamos um movimento de resistência, hoje o Governo Lula proporciona um cenário de possibilidades à Universidade Brasileira. Nos quatro primeiros anos do Governo Lula, a população universitária brasileira saltou de 3,5 para 4,5 milhões, um aumento de 28%. O ProUni, o Reuni, as cotas raciais e para estudantes oriundos de escolas públicas, o PDE, o plano nacional de assistência estudantil e a Conferencia Nacional de Educação, mostram uma nova perspectiva de acesso a educação.



Portanto, além da expansão, interiorização e aumento dos recursos para as universidades federais, é preciso reforçar a contenção do avanço do setor privado, que precisa ser fortemente regulado pelo Estado, fortalecendo as iniciativas que, no Congresso Nacional e no Conselho Nacional de Educação, seguem neste sentido.



Apesar de importantes avanços no ensino superior podemos dizer que muito ainda precisa ser transformado. Precisamos entender a educação de forma sistêmica. Por isso a Conferência Nacional de Educação será um espaço importante para pautarmos a necessidade de um sistema nacional de educação articulado e voltado aos interesses populares.



Neste sentido, ainda que existam mudanças que podem alterar o perfil e as oportunidades de formação de jovens, precisamos enfrentar a hegemonia do setor privado e da concepção mercantil de educação, voltada à formação de mão de obra e à produção de conhecimento orientada às demandas de mercado.



Em um cenário em que o neoliberalismo é duramente questionado e encontra-se enfraquecido, é fundamental concentrar esforços para desfazer o movimento que protagonizou ao longo da década de 1990 no Brasil. Ou seja, o atual período exige transferir os setores que passaram a ser alvo da exploração visando a acumulação de capital para espaços públicos que não obedeçam à lógica do mercado, sob a orientação e gestão do Estado.



Para isso precisaremos de uma UNE e um movimento estudantil fortes e mobilizados. Porém, embora ainda seja o movimento juvenil mais organizado do país o ME está longe de ser a única expressão organizada da diversidade da juventude brasileira. Os anseios e aspirações dos próprios estudantes extrapolam cada vez mais o meio universitário e a pauta educacional.



Temas como emprego e trabalho ganham mais centralidade em um ambiente de altos índices de precarização e difícil entrada no mundo de trabalho. A parcela da população jovem que trabalha ao mesmo tempo em que estuda seria muito superior aos atuais 17,7% dos jovens com 15 a 24, não fosse o alto índice de evasão escolar devido à necessidade dos jovens de trabalhar para contribuir com a renda familiar.



Ademais, a tese equivocada de que o alto índice de desemprego entre os jovens é decorrente da falta de qualificação e não da baixa oferta de postos de trabalho formal tem como conseqüência o aumento da corrida por diplomas e a procura dos bancos acadêmicos em busca de profissionalização – expectativa que geralmente é frustrada, uma vez que a graduação não é sinônimo lugar cativo no mercado de trabalho, muito menos de estabilidade financeira, realização profissional ou ascensão social.



Somado à centralidade do trabalho no imaginário e na realidade dos jovens estudantes, é preciso notar que a composição da base social do movimento estudantil tem sofrido alterações. Fatores como (a) a reserva de vagas para estudantes negros, oriundos das escolas públicas e de baixa renda, (b) o Programa Universidade para Todos (ProUni), (c) a expansão dos setores público e privado em municípios e regiões distantes dos centros urbanos, (d) o surgimento de nichos de mercado educacional voltados à população de baixa renda e (f) o aumento da oferta de cursos noturnos transformaram a cara do estudante universitário, tornando-o mais popular e menos elitista e, portanto, mais impactado por fatores objetivos do lado de fora dos muros universitários.



Contribuindo para que UNE cumpra seu papel histórico de acordo com a realidade atual da juventude brasileira e para o aprofundamento das mudanças que acontecem em nosso país, o Partido dos Trabalhadores acredita ser necessário um salto organizativo e mudanças profundas no conjunto movimento estudantil e na UNE, em especial, tornando-a uma entidade cada vez mais democrática, transparente, combativa e de lutas.



O PT no movimento estudantil se orienta pela construção de uma universidade popular e democrática, pela defesa da UNE como entidade máxima de representação dos estudantes, motivo pelo qual reprovamos o divisionismo e defendemos sua revitalização, pela democratização e aproximação da UNE das salas de aulas, pelo fortalecimento das entidades e da rede do movimento estudantil, pela articulação dos movimentos sociais com as entidades e organizações estudantis, pelo aprofundamento das transformações em curso e pelo combate à crise internacional apresentando uma alternativa de esquerda visando superar o neoliberalismo e o capitalismo.



Sabemos que se aproxima um momento decisivo para os rumos do país que exige forte pressão pelas reivindicações históricas e atuais da classe trabalhadora e do povo brasileiro. Cumprir com esta tarefa exige atuação coesa do campo democrático e popular, o fortalecimento e a combatividade dos movimentos sociais e o enraizamento do petismo em amplas parcelas da população, sobretudo entre os jovens.



Portanto, o PT e sua juventude irão incidir com intensidade na pauta política que orientará a ação dos estudantes no próximo período, visando sair deste fórum mais fortalecidos e coesos do que nunca. Convocamos os estudantes petistas, delegados e observadores ao 51º CONUNE, a construírem uma intervenção qualificada e com unidade programática, fortalecendo a UNE, o movimento estudantil e o Partido dos Trabalhadores.

terça-feira, 14 de julho de 2009


Pelo reconhecimento ao desmonte do Estado brasileiro comandado por FHC, vai aí um texto do Emir que responde nossa convicção dos novos rumos do Brasil atual, e a certeza de que não queremos mais neoliberais governando nosso país.
Abraços!

Os reconhecimentos a FHC

Que cada um expresse aqui o reconhecimento que FHC pede.

Felizmente para a oposição, FHC não se contêm, não consegue recolher-se ao fim de carreira intelectual e política melancólicos que ele merece. E cada vez que fala, o apoio ao governo e a Lula aumentam.

Agora reaparece para reclamar que não se lhe dá os reconhecimentos que ele julga merecer. Carente de apoio popular, ele vai receber aqui os reconhecimentos que conquistou.

Em primeiro lugar, o reconhecimento das elites dominantes brasileiras por ter usado sua imagem para implementar o neoliberalismo no Brasil. Por ter afirmado que ia “virar a página do getulismo”. Por ter, do alto da sua suposta sapiência, dito a milhões de brasileiros que eles são “inimpregáveis”, que ele assim não governava para eles, que não tinham lugar no país que o tinha elegido e para quem ele governava.

O reconhecimento por ter dito que “A globalização é o novo Renascimento da humanidade”, embasbacado, deslumbrado com o neoliberalismo.

O reconhecimento por ter quebrado o país por três vezes, elevado a taxa de juros a 48%, assinado cartas de intenção com o FMI, que consolidaram a subordinação do Brasil ao capital financeiro internacional.

O reconhecimento dos EUA por ter feito o Brasil ser completado subordinado às políticas de Washington, por ter preparado o caminho para a Alca, para o grande Tratado de Livre Comércio, que queria reduzir o continente a um imenso shopping Center.

O reconhecimento a FHC por ter promovido a mais prolongada recessão que o Brasil enfrentou.

O reconhecimento a FHC por ter desmontado o Estado brasileiro, tanto quanto ele pôde. Privatizou tudo o que pôde. Entregou para os grandes capitais privados a Vale do Rio Doce e outros grandes patrimônios do povo brasileiro. Por isso ele é adorado pelas elites antinacionais, por isso montaram uma fundação para ele exercer seu narcisismo, nos jardins de São Paulo, chiquérrimo, com o dinheiro que puderam ganhar das negociatas propiciadas pelo governo FHC.

FHC será sempre reconhecido pelo povo brasileiro, que tem nele a melhor expressão do anti-Brasil, de tudo o que o povo detesta, ele serve para que se tome consciência clara do que o povo não quer, do que o Brasil não deve ser.

sábado, 20 de junho de 2009

Entre quatro paredes


Caros compaheiros(as), a respeito das nossas últimas conversas e debates a respeito das esquerdas e da disputa interna em nosso partido, (algo natural no cotidiano de nossa militância política), reproduzo aqui o brilhante texto do compaheiro Emir Sader que traduz um pouco dos nossos pensamentos da maneira fratricida como setores da esquerda trata suas disputas e contradições internas muitas vezes distanciando vários setores políticos potenciais na luta pelo socilaismo e na construção e fortalecimento do campo democrático popular. Abraços a todos(as) e boas festas juninas!!!

Por *Emir Sader

Duas analises tem sido muito difundidas, ambas incorretas: uma acredita que a crise atual levou ao fim do neoliberalismo e condena o próprio capitalismo à morte. A outra afirma que todas as tentativas atuais – especialmente as latinoamericanas – de superação do neoliberalismo fracassaram ou tendem a fracassar, “traindo” os mandatos que receberam.

Parecem analises contrapostas, mas são funcionais uma à outra. Porque remetem à idéia de que as condições de superação do capitalismo estão dadas, só não se realizam pela “traição das direções políticas”, burocráticas e/ou corrompidas, cooptadas pela burguesia e pelo capitalismo.

Além de equivocadas ambas as análises servem de álibi para as derrotas da esquerda: são sempre derrotas “dos outros”. Fica-se na eterna e indispensável tarefa da denúncia, tanto da repressão, quanto das “traições”. Mas os setores mais radicais se consideram imunes às derrotas, como se ao não se aproveitar a crise do capitalismo e o esgotamento do neoliberalismo para construir alternativas de esquerda capazes de disputar hegemonia, não estaríamos sendo todos derrotados.

Ou os argumentos da esquerda estão equivocados – e a realidade insiste em provar que isso não é verdade, quando se avança é pela esquerda e as propostas de direita estão associadas à geração da crise – ou temos sido incapazes de convencimento e de construção de forças alternativas que tratem de transformar essas idéias em força concreta – econômica, social, política, ideológica. Talvez as posições concretas da esquerda ou não sejam suficientemente concretas para chegar às pessoas ou estejam erradas na sua forma. Talvez se exorbite no radicalismo verbal e isso leva a esquerda ao isolamento e ao doutrinarismo, fechando-se sobre si mesma, apegando-se excessivamente à teoria e aprendendo pouco das formas sempre novas e heterodoxas da realidade concreta. Talvez se privilegie as palavras, a doutrina, em relação à realidade concreta, esquecendo-nos que a verdade é sempre concreta.

“A teoria, quando penetra nas massas, se torna força material” – dizia Marx. Seu pensamento pretende ser ao mesmo tempo interpretação do mundo e sua transformação radical. As palavras que não se transformam em força material, que não sensibilizam, que não chegam ao povo e não são assumidas por este como vetor de mobilização e projeto de transformação da realidade, permanecem palavras, teorias, doutrinas.

Por isso um marxista é necessariamente, ao mesmo tempo, teórico e dirigente político, intelectual e militante, de forma indissolúvel.

Quanto mais setores da esquerda consideram que os projetos atualmente existentes são todos cooptados pela burguesia, projetos de uma “nova direita” disfarçada de esquerda, etc., etc., mais deveriam se sentir derrotados e desmoralizados. Porque acreditam cegamente que têm razão, mas nunca conseguem triunfar, não conseguem convencer aos amplos setores do povo das suas propostas. Deveriam se sentir mais derrotados que todos. No entanto, exibem soberba diante das derrotas, parece que as derrotas são dos outros. (Como no caso da peça do Sartre, “Entre quatro paredes”, em que “o inferno são os outros").

Muitas vezes setores da esquerda colocam como seu objetivo a disputa de espaço dentro da esquerda, a demonstração de força de que têm mais força que outros grupos de esquerda, quando o objetivo fundamental é construir e disputar hegemonia na sociedade como um todo. Tantas vezes reina o prazer quando se considera que tal pessoa ou tal grupo teria “capitulado”, quando se deveria ficar triste, porque – caso seja realmente assim – é mais uma pessoa ou um setor que abandonaria a esquerda, refletindo nossa incapacidade de conquistá-los.

As vezes dá a impressão que se considera que o gênero humano está condenado à traição e cada vez que se considera que isso acontece, gera uma espécie de satisfação interior, ao constatar que mais e mais gente morde a maçã do pecado e das garras da cooptação do capitalismo.

O debate ideológico dentro da esquerda deve ser dar em função do objetivo maior de construção de alternativas de esquerda, não de ver quem triunfa no marco fechado da esquerda. Senão o campo ficará livre para que a direita decida quem governará – e o fará sempre contra a esquerda e o campo popular.

Emir Sader, cientista político, professor da UERJ

terça-feira, 16 de junho de 2009

E a história de lutas da CUT continua ...




A história de lutas da CUT Central Única dos Trabalhadores continua, a maior central sindical da América Latina realizará seu décimo congresso, em Pernambuco acontecerá nos dias 17, 18 e 19 de junho e o presidente estadual da CUT-PE o companheiro Sérgio Goiana, espera um encontro marcante para central que viverá um novo momento de muitas lutas para o próximo período.

SERVIÇO:
O CONCUT ESTUDAL ACONTECERÁ NO AUDITÓRIO G2 DA UNICAP
QUARTA-FEIRA 17 ABERTURA AS 19:00 HS

Autoritarismo e alienação


Companheiros queria compartilhar no início desta semana este ótimo artigo do professor Luís Carlos Lopes a respeito dos últimos acontecimentos na USP uma verdadeira reação de direita a estudantes e professores da instituição que foram tratados com barbárie pelo Governo demotucano de São Paulo, o texto trata também de questões relacionadas a sociciedade viciada de consumo e individualista a que somos submetidos. Bem, boa leitura e uma semana de lutas e conquistas a todos abraços!!!

por *Luís Carlos Lopes

O que ocorreu nos últimos dias na Universidade de São Paulo demonstra, mais uma vez, a permanência do entulho autoritário na vida política e social brasileira. Estudantes, professores e funcionários públicos continuam sendo considerados inimigos do Estado e da ordem. Não podem discordar. Devem aceitar os ditames do poder. Não podem se manifestar, nem mesmo dentro da instituição de que são parte legítima e inquestionável. Se insistem, a polícia substitui a política, a violência fica no lugar do diálogo e da intercompreensão.

Nestes episódios, como em muitos outros, fica patente que ainda não encerramos completamente o velho ciclo da ditadura militar. Ela continua aí, pronta para atacar, logo que chamada a agir. Seus esbirros, mantidos pelo Estado, já não podem metralhar com balas de aço e chumbo, mas podem usar da borracha, do gás e de outras formas de intimidar. Não podem mais torturar - como gostariam - mas continuam a impor a "ordem", dentro da Universidade, bem como nas comunidades pobres, por meio da força militar. Ainda têm a coragem de reclamar de meia dúzia de pedras arremessadas pelo ódio que plantam e colhem.

O que assusta é que isto possa prenunciar o que poderá vir depois das próximas eleições presidenciais. A lógica do porrete aproxima-se velozmente do cenário nacional. Estão de parabéns os estudantes, funcionários e professores que se solidarizaram. São fascistas ou covardes os que se calaram ou tiveram a coragem de dizer que o movimento não tinha legitimidade. Dentre outras barbaridades, chegou-se a dizer que os alunos da USP eram privilegiados frente aos das escolas privadas. Aliás, onde estes estão? Será que não dá tempo de pensar, tendo que pagar grandes mensalidades para obter um diploma e um título formal, isto é, daqueles que são para agradar a família e fazer de conta que se aprendeu algo?

Não se sabe o que se passa na cabeça de tanta gente. O que é estranho é que hoje, diferentemente, dos anos sessenta e oitenta, é impressionante o grau de apatia, de consumismo e de anestesia mental dos jovens e de muitos adultos. Nada mais importa do que o último modelo de celular, a roupa de grife e o faz-de-conta da vida. Afinal, eles também estão na "fauculdade", mesmo que não saibam escrever nada e irão ser, certamente, ‘"deplomados". Se alguém duvidar, basta consultar bobagens similares na Internet, um canal de comunicação também fortemente usado na barbárie do tempo presente.

O problema não é somente que se assassine a língua. O mais grave é o desinteresse por tudo que é realmente importante na vida deles. Imagina-se, no que se refere à vida dos outros. Está-se longe da época onde o "coração de estudante" era também o dos operários e camponeses. Bater ou matar um bastava para atingir a todos. A rebeldia vinha em um átimo, logo que a notícia corria.

Hoje, ao contrário, grande parte dos estudantes foi anestesiada ao nascer. Poucos se importam ou mesmo pensam que são parte da mesma comunidade. Para manter a imunidade de acesso ao "deserto do real", basta que vejam TV, ou que usem de modo pouco inteligente as demais mídias etc. A sociedade em que estes jovens vivem é igualmente anestesiada, dar-lhe-á todo o apoio de que precisam. Nas mídias convencionais e em parte das alternativas encontrarão o mesmo conforto.

Por causa disto tudo, se têm que saudar os que sobraram. Os que não se dobram e continuam a insistir na pureza do "coração de estudante", aqueles que nunca esqueceram independentemente da idade que hoje tenham. Os que acreditam no sonho e na poesia da vida e não a pensam como algo insosso e difícil de engolir. Que venham bombas, balas de borracha, discursos mentirosos, autoridades sem respeito. Que venham todos. Eles não poderão jamais nos destruir.

*Luís Carlos Lopes é professor, sempre estudou na escola pública e fez seu doutorado na Universidade de São Paulo, no mesmo prédio bombardeado pela polícia nos recentes acontecimentos.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

uma pletora de capital: a gênese da crise econômica



Em entrevista ao jornal argentino Pagina 12, o pesquisador marxista Rolando Astarita defende que a crise não se deu só por causa de um mau funcionamento do mercado financeiro, mas da economia em seu conjunto. "Produziu-se o que Marx chamava “uma pletora de capital”: capital líquido abundante, taxas de juros muito baixas (dirigidos pelo Federal Reserve e pela entrada de capitais que buscavam refúgio nos EUA) e uma super-oferta do crédito. Esses capitais líquidos terminaram no setor da construção, onde encontraram um campo de expansão relativamente rápido. E terminou explodindo".

Natalia Aruguete - Página 12

Diversas posturas econômicas, desde progressistas a heterodoxas, afirmam que estamos numa época de hegemonia do setor financeiro sobre o produtivo e numa hipertrofia do capital especulativo, que deixou a descoberto o estancamento da economia mundial nos últimos 30 anos. Num diálogo com o caderno Cash, suplemente econômico do Página 12, o pesquisador marxista Rolando Astarita assinalou que, na realidade, no último quarto de século houve uma expansão mundial do capitalismo, que a distância entre ricos e pobres não impediu o crescimento dos mercados e que a crise não se deu só por um mal funcionamento do mercado financeiro, mas da economia em seu conjunto. “Há que se pensar o tal do capital fictício com parâmetros; ele não pode nos fazer perder a análise estrutural”, explicou.

Pagina12: Acreditas que a crise financeira marca a queda da ditadura das finanças?
Roland Astarita: Não vejo que haja uma ditadura das finanças, mas um domínio do capital em geral, acentuado de maneira muito profunda a partir dos anos 80. No último quarto de século, o disciplinamento do capital sobre as classes trabalhadoras operou através de mecanismos diretos, mas também do mercado, com políticas monetárias duras, aberturas comerciais, flexibilização laboral. Mas não vejo distinção de setores dentro do capital.

P12: No entanto, o crédito e as dívidas cresceram em todo o mundo. Isso pode ter afetado o desenvolvimento da economia real?
RA: Nunca houve desenvolvimento do capitalismo sem desenvolvimento do crédito e de uma monetarização da economia. Na perspectiva de Marx, o crédito é uma alavanca da acumulação de capital. Isto também se vê na fase que vai de 1890 a 1929. Na China, junto à expansão capitalista cresceram seus índices monetários e a participação dos mercados financeiros. Mas o crédito também potencializa as possibilidades de especulação, de sobre-acumulação e de quebradeira. Marx trabalhava com tendências e contra-tendências. Hoje, ao contrário, toma-se só um aspecto da realidade.

P12: Alguns sustentam que o crescimento do crédito prova o estancamento do sistema capitalista.
RA: A idéia de que o sistema capitalista está estancado há 25 anos não resiste à análise da realidade. Nos últimos 30 anos a economia capitalista teve taxas de expansão superiores a 3% em nível mundial, ainda que tenham sido desiguais: o Japão está estancado desde 1992 e a Europa teve um crescimento débil. Houve uma expansão geográfica do sistema capitalista, que entrou na China, no Leste Europe e na Rússia, e um aprofundamento das relações capitalistas. O aumento da produtiviade na economia dos EUA desde 1995 foi maior do que 3% ao ano. O crédito atua como uma potencialização de tendências do sistema e muitas vezes permite que um ciclo econômico se expanda para além de suas possibilidades. Em 2001 os EUA sofreram uma recessão suave. A economia cresceu 0,8% e o crédito lubrificou os mecanismos econômicos. Mas a recuperação de 2002 foi débil, com pouca geração de postos de trabalho e débil recuperação do investimento.

P12: Nesse contexto o crédito migrou para que setores?
RA: Para a construção residencial e para o consumo em geral, não para as empresas. Desde 2000 as empresas dos EUA e do G7 diminuíram sua dependência do sistema financeiro. Houve um excesso de poupança e as empresas diminuíram suas dívidas com os bancos. Inclusive, usaram parte dessa liquidez para recomprar suas ações. Não houve uma grande expansão do investimento produtivo, mas tampouco uma dependência do capital produtivo em relação ao financeiro. As relações de dependência voltaram em meados dos anos 70. Não se pode dizer que fosse uma crise como a diagnosticada a la Hyman Minsky, um autor keynesiano que sustentava que as crises se produzem porque as empresas caem num sobre-endividamento e pagam dívida com dívida até que a situação exploda.

P12: No entanto, houve uma “financeirização dos consumidores”, com a qual se amorteceu a crise de 2001.
RA: E ademais ajudou a recuperação de 2002. Isso é certo. O equivocado é pensar que isso atuou isoladamente. Em 2001, a superabundância de capital líquido e o investimento débil ocorreram porque a taxa de rentabilidade do capital vinha se debilitando desde 1996/7. Esse é o fundo do problema. Produziu-se o que Marx chamava “uma pletora de capital”: capital líquido abundante, taxas de juros muito baixas (dirigidos pelo Federal Reserve e pela entrada de capitais que buscavam refúgio nos EUA) e uma super-oferta do crédito. Esses capitais líquidos terminaram no setor da construção, onde encontraram um campo de expansão relativamente rápido. E terminou explodindo.

P12: Também se diz que, desde os anos setenta, o mundo assiste a uma crise de superprodução combinada com uma crise de subprodução.
RA: Há dois tipos de explicações da crise. Uma diz que o problema da crise deu-se com as finanças. Outra, que a Argentina repete bastante, que se deve a uma importante desigualdade de renda, o que produziu uma crise de consumo por falta de demanda. Creio que isto tampouco explica o que aconteceu. No último quarto de século houve um processo de “proletarização”, enormes massas da população se incorporaram no exército de assalariados. Os casos mais ressonantes são China e Índia. Isso supõe uma ampliação de mercados, enquanto houver crescimento nos lucros. Segundo a The Economist, nos Estados Unidos 0,1% da população ganha 77% vezes mais do que 90% da população restante. Nos anos 70 essa diferença era de 1 para 20. Também na China a desigualdade cresce. Mas não é certo que se a desigualdade cresce, crescem os mercados.

P12: Neste crescimento da economia capitalista, como se compõe o produto bruto no mundo?
RA: No caso dos Estados Unidos, desde a recuperação de 2001 se geraram fenômenos de sobre-acumulação de capital e de queda da taxa de rentabilidade. Esse é o pano de fundo da crise. Sobre isso o fator financeiro atuou, mas também o crescimento desproporcional na construção residencial, entre 2001-2007. Sua participação no PIB passou de 4,2% a mais de 6%. Isso gera tensões, porque um setor está crescendo em taxas muito superiores ao resto, e num contexto em que os investimentos se mantêm débeis. Isso potencializou o sistema de crédito e deu-se uma sobre-expansão do setor em relação às necessidades da economia.

P12: Pegando apenas o setor financeiro, o crescimento da sua participação no PIB dos EUA implicou uma mudança ou uma continuidade em relação a etapas anteriores?
RA: Não me parece que a taxa de crescimento tenha se acelerado desde 1979-80. Entre 1895 e 1929, a taxa de crescimento desse setor nos EUA foi superior a dos últimos vinte anos. Com a crise dos anos 30, o setor financeiro diminuiu sua participação na economia e recuperou terreno desde a década de 50, com um crescimento relativamente constante desde 1960. Não houve uma queda importante nos anos 80, ainda que as taxas de juros tenham aumentando muito: entre 1979 e 1985, o peso dos juros nos balanços empresariais subiu consideravelmente. Isso expressa parte da tese da financeirização, mas não se converteu em algo permanente.

P12: Por que?
RA: Prognosticou-se que iria se produzir uma punção permanente do setor financeiro sobre o lucro empresarial, mediante a taxa de juros. E que isso debilitaria o setor produtivo e levaria ao estancamento. Mas insisto que o peso dos juros sobre o setor produtivo tendeu a baixar. Segundo dados do Official Bureau of Economic Analysis dos Estados Unidos, entre 2006 e princípios de 2007, esse peso estava nos níveis de 1970, que era uma época keynesiana. Penso que esta é uma crise muito grave, muito profunda, mas estamos longe de uma crise como a dos anos 30.

P12: Então acreditas que não há um predomínio do capital fictírico sobre o produtivo, em detrimento da economia real?
RA: Há que se perguntar até que ponto isso é novidade. Quando houve expansão de capital no sistema capitalista, na Bolsa de Valores houve sobrevalorizações. Tradicionalmente, metade disso estaria em 10 anos de price earning (1). No momento de euforia das bolsas, alcançou 20 ou 30 anos. Isso ajuda à instabilidade do sistema capitalista, já que provoca inflação dos lucros que desaparecem da noite para o dia, mas esses lucros não crescem à margem do trabalho produtivo.

P12: Acreditas que a crise atual reflita esse mecanismo?
RA: Aqui estouraram ativos financeiros ligados ao crédito, que se havia sobrevalorizado. O estouro reflete que a economia estava funcionando mal. Há que se pensar o tal do capital ficítcio com parâmetros; ele não deve nos fazer perder a análise estrutural. Ao extrair a mais valia e a realizá-la nos mercados, pode haver inflações que terminam arrebentando. Mas, à medida que a instabilidade se agrava, as crises não se explicam por si mesmas.

P12: Pode estabelecer-se alguma relação entre o excesso de liquidez e a tendência à financeirização da economia?
RA: Esse excesso de liquidez deveu-se à debilidade do investimento produtivo. Em determinado momento, houve setores que super-acumularam. Os neoclássicos interpretaram esse fenômeno como uma decisão das instâncias domésticas, das famílias, quando, na realidade, foi uma debilidade no investimento. Um exemplo é a queda de investimento na Ásia – com exceção da China – depois da crise de 1997-98. Essa massa de capital líquido pressiona sobre o setor financeiro em busca de sua valorização. Mas há que se destacar a relação de causalidade. O crescimento deste setor é consequência da acumulação de capital, ele não opera por fora do conjunto dos problemas dessa acumulação. A interpretação dos neokeynesianos – que hoje são mainstream – é a do acelerador financeiro. Quer dizer, o uso dos ativos financeiros como garantias em empréstimos, até que, em determinado momento, produza-se um choque que se potencializa através do mecanismo financeiro.

P12: E qual a tua opinião sobre esse diagnóstico?
RA: Há aspectos de realidade importantes, mas não analisa a quê se deve o choque, de onde vem. É o próprio sistema de competição capitalista que obriga a um banco a competir com outros para oferecer mais rentabilidades. Se não os ligamos aos problemas de fundo, não entendemos por que essas especulações podem explodir numa brutal crise financeira, que nem sempre afeta a economia. Por exemplo: o crash de Wall Street de 1987 não se tornou uma crise global e foi a segunda grande queda da bolsa dos Estados Unidos.

P12: No encontro do G20 propô-se uma maior regulação dos mercados como forma de sustentar a situação econômica. Crês que essa seria uma solução?
RA: No G20 a regulação dos mercados foi defendida como uma grande questão para depois da crise. Hoje a discussão é até que grau há de se ter intervenção estatal e se medidas protecionistas serão ou não aplicadas. Todo mundo pede que não haja medidas protecionistas mas, no fundo, muitos as aplicam. Sobre isso gostaria de fazer duas reflexões. Os mercados financeiros e capitalistas pressionam para afastar as regulações. As regulações da Basiléia estabeleceram que os bancos deviam ter certa ratio de capital em relação a sua carteira de ativos. Mas os bancos criaram “Sociedades de Propósitos Especiais” (espécie de fideicomisso) para armar suas operações por fora do balanço e, assim, comprar papéis que essas entidades emitiam.

P12: E a segunda reflexão?
RA: Lênin dizia que estavam bem as consignas, mas há que se pensar em quem as aplica. No G20, defendeu-se que o FMI deve retomar o poder de regular. Esse organismo está governado pelas grandes potências, os grandes banqueiros e o capital internacionalizado. Vai responder a esses interesses. É um controle dos altos comandos do capital para evitar desequilíbrios. Não há controles em abstrato.

Publicado no suplemento CASH, do jornal argentino Pagina 12, em 17 de maio de 2009. Para conhecer o trabalho, os interesses e parte das publicações do professor Rolando Astarita, ver a sua página: www.rolandoastarita.com

Tradução: Katarina Peixoto

(1) Ratio Price Earning é um indicador (normalmente designado por P/E ou PER) de análise do valor de uma ação. É a medida estabelecida entre o preço da ação e os lucros das empresas. Quanto mais elevado for o seu valor, mais cara deverá estar a ação e vice-versa. Exemplo: se a Empresa X estiver cotada a € 60 por ação e os seus lucros forem de € 3 por ação, o seu PER é de 20 (60/3). Isto significa que os investidores estão pagando € 20 por cada € 1 de lucros da Empresa X. Esta relação é também conhecida por stock multiple, significando que a Empresa X está a negociar num múltiplo de 20 vezes os seus lucros. Este é um indicador muito utilizado pelos analistas e um dos mais conhecidos dos investidores. Na verdade, é muito frequente ver na imprensa a referência a uma ação como cara ou barata apenas por referência ao PER. Veja-se a estratégia de investimento boas & baratas divulgada pela Revista Carteira, em que um dos critérios para selecção das acções é um PER inferior a 14, dado que este representa aproximadamente a média a nível mundial. Porém, a realidade não é assim tão clara e de simples análise. O PER tem limitações e devem ser conhecidas do investidor, de modo a que não se tomem decisões apenas com base nele. N.deT.

Com http://www.analistafinanceiro.com/fiscal-financeiro/o-price-earnings-ratio-pe-ou-per/

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Criminalização das lideranças indígenas de Pernambuco já foi denunciada à OEA


"Cacique do povo Xukuru é
condenado antes de depoimento
de suas testemunhas de defesa

A Justiça Federal em Pernambuco condenou o cacique Marcos Luidson, do povo Xukuru, a 10 anos e quatro meses de prisão. A sentença foi publicada no dia 21 de maio, apesar do depoimento de uma testemunha de defesa de Marcos, o deputado federal Fernando Ferro (PT/PE) estar marcado para amanhã (28 de maio) em Brasília. Marcos foi condenado na ação que trata de um conflito ocorrido em 2003, dentro da terra Xukuru, agreste de Pernambuco.

Além do cacique, os indígenas Paulo Ferreira Leite, Armando Bezerra Coelho, Rinaldo Feitosa Vieira e Ronaldo Jorge de Melo foram condenados a quatro anos e oito meses de reclusão. Outros 26 Xukuru já haviam sido condenados, em janeiro de 2009, também acusados de participar do mesmo conflito. Os advogados dos indígenas recorreram da decisão ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região, em Recife. Os Xukuru aguardam o julgamento do TRF em liberdade, exceto Rinaldo Vieira, que está preso desde 2008 acusado, sem provas, de envolvimento num assassinato.

A prisão de Rinaldo e a condenação dos 31 Xukuru são a expressão do processo de criminalização que o povo enfrenta há mais de uma década, por causa da reconquista da terra. Atualmente, pelo menos 43 Xukuru estão sendo processados; dois estão presos; 31 foram condenados e os outros dez aguardam julgamento. Os interesses de elites políticas e econômicas da região estão por trás da tentativa de desestruturar os Xukuru, por meio da criminalização de suas lideranças.. Esse processo foi denunciado, em março de 2009, à Organização dos Estados Americanos (OEA).

Julgamento questionado
No dia 7 de fevereiro de 2003, José Lourival Frazão (Louro Frazão), indígena Xukuru, assassinou dois jovens indígenas, Josenilson José dos Santos (Nilsinho) e José Adenilson Barbosa da Silva (Nilson), durante um atentado contra o cacique Marcos Xukuru, que conseguiu escapar. Naquele dia, a comunidade, indignada com o crime, se voltou, incontrolada, contra um grupo de famílias Xukuru ligadas ao assassino - todos aliados dos antigos invasores da terra indígena.

A investigação e o processo judicial sobre esse conflito foram questionados por antropólogos e entidades de defesa dos Direitos Humanos de Pernambuco. Os advogados de defesa dos Xukuru questionam o cerceamento de direito de defesa e o tamanho das penas, considerado exagerado. No caso da condenação do cacique Marcos Xukuru, a sentença foi publicada antes de se juntar ao processo os depoimentos de importantes testemunhas de defesa: o deputado federal Fernando Ferro e a Sub-procuradora Geral da República Raquel Dodge.

Marcy Picanço
Cimi - Assessoria de Comunicação
cimi.org.br

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Soneto do gato morto


Um gato vivo é qualquer coisa linda
Nada existe com mais serenidade
Mesmo parado ele caminha ainda
As selvas sinuosas da saudade

De ter sido feroz. À sua vinda
Altas correntes de eletricidade
Rompem do ar as lâminas em cinza
Numa silenciosa tempestade.

Por isso ele está sempre a rir de cada
Um de nós, e a morrer perde o veludo
Fica torpe, ao avesso, opaco, torto

Acaba, é o antigato; porque nada
Nada parece mais com o fim de tudo
Que um gato morto.

Vina

Florença, 11.1963

terça-feira, 12 de maio de 2009

Desculpem a moléstia


Caros Companheiros posto aqui este maravilhoso texto do mestre Eduardo Galeano extraído do site de Carta Maior para leitura e reflexão de todos(as)! Abraço e boa semana de lutas a todos(as).

Por Eduardo Galeano

Quero compartilhar com vocês algumas perguntas, moscas que zumbem na minha cabeça:

O sapatista do Iraque, o que jogou os sapatos contra Bush, foi condenado a três anos de prisão. Não merecia, na verdade, uma condecoração?

Quem é o terrorista? O sapatista ou o sapateado? Não é culpado de terrorismo o serial killer que, mentindo, inventou a guerra do Iraque, assassinou a um montão de gente, legalizou a tortura e mandou aplicá-la?

São culpados os habitantes de Atenco, no México, ou os indígenas mapuches do Chile, ou os kekchies da Guatemala, ou os camponeses sem terra do Brasil, todos acusados de terrorismo por defenderem seu direito à terra? Se sagrada é a terra, mesmo se a lei não o diga, não são sagrados também os que a defendem?

Segundo a revista Foreign Policy, a Somália é o lugar mais perigoso do mundo. Mas quem são os piratas? Os mortos de fome que assaltam navios ou os especuladores de Wall Street, que há anos assaltam o mundo e agora recebem multimilionárias recompensas por suas atividades?

Porque o mundo premia os que o saqueiam?

Por que a justiça é cega de um único olho? Wal Mart, a empresa mais poderosa de todas, proíbe os sindicatos. McDonald’s, também. Por que estas empresa violam, com delinqüente impunidade, a lei internacional? Será que é por que no mundo do nosso tempo o trabalho vale menos do que o lixo e valem menos ainda os direitos dos trabalhadores?

Quem são os justos e quem são os injustos? Se a justiça internacional realmente existe, por que não julga nunca aos poderosos? Não são presos os autores dos mais ferozes massacres? Será que é porque são eles que têm as chaves das prisões?

Por que são intocáveis as cinco potências que tem direito de veto nas Nações Unidas? Esse direito tem origem divina? Velam pela paz os que fazem o negócio da guerra? É justo que a paz mundial esteja a cargo das cinco potências que são as cinco principais produtoras de armas? Sem desprezar os narcotraficantes, este também não é um caso de “crime organizado”?

Mas não demandam castigo contra os senhores do mundo os clamores dos que exigem, em todos os lugares, a pena de morte. Só faltava isso. Os clamores clamam contra os assassinos que usam navalhas, não contra os que usam mísseis.

E a gente se pergunta: já que esses justiceiros estão tão loucos de vontade de matar, por que não exigem a pena de morte contra a injustiça social? É justo um mundo em que a cada minuto destina três milhões de dólares aos gastos militares, enquanto a cada minuto morrem quinze crianças por fome ou doença curável? Contra quem se arma, até os dentes, a chamada comunidade internacional? Contra a pobreza ou contra os pobres?

Por que os adeptos fervorosos da pena de morte não exigem a pena de morte contra os valores da sociedade de consumo, que cotidianamente atentam contra a segurança pública? Ou por acaso não convida ao crime o bombardeio de publicidade que aturde a milhões e milhões de jovens desempregados ou mal pagos, repetindo para eles dia e noite que ser é ter, ter um automóvel, ter sapatos de marca, ter, ter, e que, quem não tem, não é?

E por que não se implanta a pena de morte contra a pena de morte? O mundo está organizado a serviço da morte. Ou não fabrica a morte a industria militar, que devora a maior parte dos nossos recursos e boa parte das nossas energias? Os senhores do mundo só condenam a violência quando são outros os que a exercem. E este monopólio da violência se traduz em um fato inexplicável para os extraterrestres e também insuportável para os terrestres que ainda queremos, contra toda evidência, sobreviver: os humanos somos os únicos especializados no extermínio mútuo e desenvolvemos uma tecnologia da destruição que está aniquilando, de passagem, ao planeta e a todos os seus habitantes.

Esta tecnologia se alimenta do medo. É o medo que fabrica os inimigos que justificam o desperdício militar e policial. E em vias de implantar a pena de morte, que tal se condenamos à morte o medo? Não seria saudável acabar com essa ditadura universal dos assustadores profissionais? Os semeadores de pânico nos condenam à solidão, nos proíbem a solidariedade: salve-se quem puder, destruam-se uns aos outros, o próximo é sempre um perigo que se aproxima, olho, cuidado, esse cara vai te roubar, aquele vai te violar, este carrinho de nenê esconde bomba muçulmana e se essa mulher te olha, essa vizinha de aspecto inocente, certamente vai te contagiar com a gripe suína.

No mundo de cabeça para baixo, dão medo até os mais elementares atos de justiça e de bom senso. Quando o presidente Evo Morales começou a refundação da Bolívia, para que esse país de maioria indígena, deixasse de ter vergonha de olhar no espelho, provocou pânico. Este desafio era catastrófico do ponto de vista da ordem racista tradicional, que dizia que era a unida ordem possível. Evo era, trazia o caos e a violência e por sua culpa a unidade nacional ia explodir em pedaços. E quando o presidente equatoriano Rafael Correa anunciou que se negava a pagar as dívidas não legítimas, a noticia produziu terror no mundo financeiro e o Equador foi ameaçado com terríveis castigos, por estar dando um tão mau exemplo. Se as ditaduras militares e os políticos ladrões foram sempre mimados pelos bancos internacionais, não nos acostumamos já a aceitar como fatalidade do destino que o povo pague o garrote que o golpeia e a cobiça que o saqueia?

Mas será que se divorciaram para sempre o bom senso e a justiça? Não nasceram para andar juntos, bem pegadinhos, o bom senso e a justiça?
Não é de bom senso, e também de justiça, esse lema das feministas que dizem que se nós, os machos, ficássemos grávidos, o aborto seria livre? Por que não se legaliza o direito ao aborto? Será por que então deixaria de ser o privilegio das mulheres que podem pagá-lo e dos médicos que podem cobrá-lo?

O mesmo acontece com outro escandaloso caso de negação da justiça e do bom senso: por que não se legalizam as drogas? Por acaso não se trata, como no caso do aborto, uma questão de saúde publica? E o país que tem mais drogados, que autoridade moral tem, que autoridade moral tem para condenar os que abastecem sua demanda? E por que os grandes meios de comunicação, tão consagrados à guerra contra o flagelo da droga, não dizem nunca que provém do Afeganistão quase toda a heroína que se consome no mundo? Quem manda no Afeganistão? Não é esse um país ocupado militarmente pelo pais messiânico que se atribui a missão de salvar a todos nós?

Por que não se legalizam as drogas pura e simplesmente? Não será por que elas dão o melhor pretexto para as invasões militares, além de brindar os mais suculentos lucros aos bancos que de noite trabalham como lavanderias?

Agora o mundo está triste porque se vendem menos carros. Uma das conseqüências da crise mundial é a queda da próspera indústria automobilística. Se tivéssemos algum resto de bom senso e um pouquinho de sentido de justiça, não teríamos que celebrar essa boa noticia? Ou por acaso a diminuição de automóveis não é uma boa noticia, do ponto de vista da natureza, que estará um pouquinho menos envenenada e dos pedestres, que morrerão um pouco menos?

Segundo Lewis Carroll, a Rainha explicou a Alice como funciona a justiça no país das maravilhas:

- Ai você tem – disse a Rainha. Está presa cumprindo sua condenação, mas o processo só vai começar na segunda-feira. E, claro, o crime será cometido no final.

Em El Salvador, o arcebispo Oscar Arnulfo Romero comprovou que a justiça, como a serpente, só morde os descalços. Ele morreu baleado, por denunciar que no seu país os descalços nasciam condenados de antemão, pelo delito de nascimento.

O resultado das recentes eleições em El Salvador não é de alguma forma uma homenagem? Uma homenagem ao arcebispo Romero e aos milhares que como ele morreram lutando por uma justiça justa no reino da injustiça?
Às vezes acabam mal as historias da História, mas ela, a História, não acaba. Quando diz adeus, está dizendo até logo.

Tradução: Emir Sader
Publicado no site Carta Maior

terça-feira, 5 de maio de 2009

O novo Enem e a democratização do ensino superior


Por Gabriel Magno e
Rafael Chagas

A democratização do acesso à universidade pública é uma bandeira histórica defendida pelos movimentos sociais. O Ministério da Educação no dia 8 de abril lançou uma proposta de criação de um novo exame nacional de avaliação do ensino médio (ENEM), e de um sistema de seleção unificada para o ensino superior. As instituições de ensino superior tem autonomia para decidirem se querem aderir ao novo sistema. Esta proposta de acabar com o vestibular que temos hoje como forma de acesso por si só não democratiza o acesso a universidade, mas certamente avança muito neste sentido. Essa medida deve vir acompanhada com o aumento de verbas para as universidades, com uma política de assistência estudantil, e principalmente com a melhoria dos ensinos fundamental e médio públicos.
A proposta do MEC de unificar o acesso às universidades públicas e particulares através do ENEM, que será reformulado, traz uma discussão importante para dentro das universidades de disputa de projeto de sociedade, no sentido que traz mudanças significativas no acesso ao ensino superior e na política de permanência estudantil.
Sempre defendemos uma nova forma de acesso e entrada nas universidades brasileiras. Isso sempre fez parte de um projeto de sociedade justa e libertária. A construção de uma Universidade Democrática e Popular também passa por democratizar e ampliar o acesso a ela. E na medida que se amplia o acesso, e a democratiza, maior se torna a necessidade de garantir a permanência do e da estudante na universidade. Políticas de assistência estudantil se tornam fundamentais para garantir a construção dessa universidade. Para isso é necessário a garantia de recursos para assistência com rubrica específica.
Do ponto de vista do acesso, a proposta amplia e democratiza a entrada dos e das estudantes no ensino supeior. A proposta do novo ENEM prevê uma mudança radical dos critérios de avaliação cobrado para entrada no ensino superior. Saímos de uma avaliação conteudista, que não valoriza a capacidade de interpretação da juventude e que não respeita os parâmetros curriculares nacionais dos ensinos fundamental e médio. A forma de vestibular que temos favorece a lógica de mercado da educação com a propagação exponencial dos cursinhos pré-vestibulares, que priorizam a decoreba de fórmulas e regras que não fazem o menor sentido para a realidade de nossa juventude. Defendemos uma forma de avaliação que valoriza a interpretação, a leitura, o raciocínio lógico e a análise do conteúdo aplicado a sua realidade e temas que cercam nosso cotidiano.
Um ponto importante de se destacar é que o desempenho dos e das estudantes nas escolas públicas no ENEM é igual ou superior aos dos/das estudantes nas escolas particulares. Isso inverte a lógica dos vestibulares tradicionais conteudísticos que por sua natureza geram desigualdades de participação, onde prevalece a lógica financeira (condições de pagar um cursinho pré-vestibular, uma escola particular que não tem compromisso com uma educação emancipadora, mas apenas focada em um treinamento para fazer uma prova).
Mas para superar de vez a lógica dos cursinhos pré-vestibular é preciso mais que mudar o conteúdo das provas. É necessário o estabelecimento de uma avaliação seriada, que os estudantes sejam avaliados nos 3 anos do ensino médio e não somente no último ano com apenas uma prova.
Outro fator importante é que esta proposta caminha no sentido da construção de um sistema nacional de educação. As universidades teriam um instrumento único de ingresso e o ensino médio no Brasil teria que unificar seus currículos e as matérias oferecidas, eliminando as barreiras regionais hoje existentes no nosso sistema educacional. Um/uma estudante que tem que mudar de cidade, região ou estado sente na pele essas discrepâncias de não termos uma política nacional de educação, ou de uma educação voltada apenas para as provas de vestibulares de cada estado e região, e não por uma educação emancipadora. Por isso será fundamental que esta discussão seja feita na Conferência Nacional de Educação em que a pauta central será a formação de um sistema nacional articulado de educação.
Essas mudanças de estrutura no acesso permitem uma maior entrada de estudantes das nossas escolas públicas e de jovens oriundos das classes populares. no ensino supeirior. Outra mudança importante na estrutura hoje da demografia das universidades é a possibilidade de maior mobilidade. Atualmente, um dado assustador é que apenas 1% dos/das estudantes universitários/as saíram de sua cidade natal para frequentar um curso superior. Isso indica que se um jovem nasce em uma cidade/região que não possua uma universidade ou faculdade, ele não tem condições de ingressar em um curso superior.
Essa maior entrada de estudantes das classes populares e numa maior mobilidade estudantil traz a tona a importante discussão da assistência estudantil. O MEC junto com a proposta de reformulação do ENEM, garante para as universidades que aderirem à proposta um acréscimo na rubrica específica para assistência estudantil de R$ 200 milhões por ano. É um avanço, porém ainda insuficiente para as atuais demandas existentes e para as novas que serão criadas com a maior mobilidade estudantil. É tarefa da UNE ir para rua e fazer a disputa para garantir o aumento da rubrica específica de assistência estudantil.
A UNE cumpre um papel importante na luta por uma educação pública, gratuita e de qualidade, socialmente referenciada., e cabe a ela , numa situação importante para os rumos da educação no país ,ser protagonista dessa transformação. Ir para as ruas e fazer a disputa do projeto da reforma universitária, por uma Universidade Democrática e Popular, faz parte do papel histórico que a União Nacional dos Estudantes tem que cumprir. Cabe a UNE fazer sim a defesa do projeto do novo ENEM, pois garante um avanço nas políticas de inclusão e democratização no ensino superior, mas que aponte mudanças e avanços, como na ampliação da rubrica específica para assistência estudantil, já que acesso e permanência devem estar. É fundamental também que a UNE exija sua participação no conselho de reformulação do novo ENEM. Temos que ser protagonistas dessa transformação.

Gabriel Magno é coordenador de Formação da JPT-DF e professor de Educação Básica
Rafael Chagas é diretor de Políticas Educacionais da UNE
Publicado no site do PT www.pt.org.br

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Entidades querem amplo debate sobre a nova proposta de vestibular


Entidades representativas de instituições federais de ensino superior, dos professores e estudantes querem um amplo debate sobre o novo modelo de vestibular proposto pelo governo.
A nova proposta foi recebida com entusiasmo, mas despertou incertezas e dúvidas acerca da segurança do novo modelo, à manutenção da autonomia das universidades e à garantia na qualidade dos alunos que serão selecionados pelo novo vestibular proposto, que prevê uma prova única em todo o País. A proposta do Ministério da Educação é de que o atual Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) seja aprimorado e usado como porta de entrada para as universidades federais.

“É uma iniciativa muito positiva, porém temos que conservar sobre três importantes aspectos: autonomia das universidades, garantia de ingresso dos candidatos mais preparados e segurança no processo seletivo. A segurança deste novo processo precisa ser plena”, afirmou o Secretário Executivo da Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Gustavo Balduino. Segundo ele, o vestibular é um dos processos seletivos mais respeitados pela sociedade atualmente.
O secretário anunciou a realização de um seminário para tratar das mudanças nos próximos dias 27 e 28. O evento será em Brasília e deverá contar com a participação de todas as entidades envolvidas no processo. “Ainda não temos uma opinião formada sobre a proposta. Vamos intensificar o debate para assegurar que estas questões sejam asseguradas”, afirmou.

Exaustão

O presidente do Fórum de Professores das Instituições Federais de Ensino Superior (Proifes), Gil Vicente Figueiredo, disse que para a instituição, o atual modelo de vestibular está ultrapassado. “O vestibular aplicado hoje deixa muito a desejar. Esta é uma proposta importantíssima e inovadora que merece um amplo debate com a sociedade e as entidades de ensino superior e estudantes. Como toda proposta nova, ela requer uma profunda avaliação”, afirmou.
Uma das preocupações da instituição, segundo o dirigente, é com as disparidades regionais na qualidade do ensino praticado no País. “A unificação das provas traz benefícios e malefícios. Existem diferenças regionais no ensino brasileiro que precisam ser consideradas neste novo processo. Temos que assegurar que alunos de qualquer região do País tenham condições de acesso às vagas, independentemente de onde tenham cursado o ensino médio”, disse.

Descontentamento

Para a União Nacional dos Estudantes (UNE) a simples substituição do vestibular pelo Enem não será suficiente para aprimorar o processo seletivo do País. “A proposta apresentada pelo MEC é resultado de pressões históricas dos movimentos estudantis por mudanças no processo seletivo. No entanto, esperavamos ser ouvidos quando da elaboração desta proposta. Acreditamos que é preciso fazer mais do que substituir o vestibular pelo Enem”, afirmou Lúcia Stumpf, presidente da UNE.
Uma das propostas da UNE é a de que a seleção seja feita em avaliações seriadas, semelhante ao Programa de Avaliação Seriada (PAS), implantado pela Universidade Federal de Brasília, onde o aluno faz três provas no primeiro, segundo e terceiro ano do ensino médio, respectivamente. “Desta maneira, o aluno faria o teste de aprendizado assim que concluir cada fase. Isso nos daria uma leitura mais pontual do grau de assimilação do aluno e evitaria as práticas do decoreba. Ao final dos três anos, a média das provas seria a nota do aluno para disputar o processo seletivo das federais”, propôs Lúcia Stumpf.

Assistência estudantil

A UNE também defende que a proposta venha associada a recursos para assistência estudantil e indicação de cotas para alunos de baixo poder aquisitivo e negros. “Para assegurar mobilidade o governo precisa indicar recursos para o custeio dos alunos que eventualmente venham de outros estados. Recursos para transporte, alimentação e moradia são indispensáveis para o novo modelo. Além disso, há ainda a necessidade de implementação de cotas para assegurar o acesso de todas as classes sociais”, afirmou Lúcia Stumpf.